segunda-feira, 5 de março de 2018

Sobre o filme «Eu, Tonya» de Craig Gillespie, 2017



















Eis uma comédia expressionista sobre tudo o que há de mais sério. A América suja, triste, paupérrima, sem eira nem beira, onde o sonho americano é substituído pelo desespero que busca a fama e o dinheiro.

Baseados em factos atrozmente reais, o realizador Craig Gillespie provoca um documentário falso que persegue uma ficção real. Se nos rimos é porque nos custa ver personagens próximas da realidade a cair no abismo da sua própria caricatura, onde a violência doméstica, a violência verbal, a violência social, apenas nos indica como a arte na América é criada sobre os próprios escombros.

Tonya Harding (Margot Robbie) tem um enorme talento para a patinagem no gelo. [Essa arte em esforço, rodopiando fria sobre lâminas.] A mãe LaVona (Allison Janney) sabe isso e tenta que ela, desde pequenina, venha a ser a melhor patinadora do mundo. E consegue. A treinadora Diane Rawlinson (Julianne Nicholson) conhece a competência de Tonya para vencer. O marido Jeff (Sebastian Stan), com quem se casa aos 18 anos, também. Todos fazem o impossível. Mesmo que o crime esteja por perto e sejam acusados, próximo das Olimpíadas de Inverno de 1994, de maltratar brutalmente a rival, Nancy Kerrigan.

Um dos grandes trunfos do filme são as interpretações de Margot Robbie, Allison Janney e Sebastian Stan. Outro é a narrativa de Craig Gillespie feita de planos rápidos, truncados, quase aflitos, dando expressão a um quadro único de resistência à agressividade e à contrariedade social.

O filme torna-se muito particular, sendo uma das comédias mais violentas que vi ultimamente, ao revelar a capacidade humana das personagens de serem agressor e agredido, de suportar o vexame, serem ridículos e tristes, e ainda assim, continuarem em frente.

jef, março 2018
                                                                      
«Eu, Tonya» (I, Tonya) de Craig Gillespie. Com Margot Robbie, Allison Janney, Bobby Cannavale, Julianne Nicholson, Caitlin Carver, Sebastian Stan. EUA, 2017, Cores, 120 min.

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