segunda-feira, 6 de maio de 2024

Sobre o livro «Antes que o Café Arrefeça» de Toshikazu Kawaguchi, Editorial Presença 2023. Tradução da versão inglesa de Isabel Nunes e Helena Sobral.










Desconheço a cultura japonesa. Porém, muitos filmes japoneses fazem parte da minha mais restricta e secreta cinefilia emocional.

«Viver» de Akira Kurosawa 1952. «Crepúsculo em Tóquio» de Yasujiro Ozu. 1957. «Primavera Tardia» de Yasujiro Ozu, 1949. «O Som do Nevoeiro» de Hiroshi Shimizu, 1956. «Viagem a Tóquio» de Yasujiro Ozu, 1953. «Ninguém Sabe» Hirokazu Kore-eda, 2004. Por exemplo.

Por eles, entendo como nesse país o tempo entre gerações e o espaço entre os elementos da família são medidos através de uma profunda (com)paixão, uma enorme reverência, uma resignada cerimónia. Tudo enlaçado pela comoção, pela poesia, pelo dramatismo.

Talvez por isso, esqueça as paragonas comerciais com que a editora vende o livro e encontre nele apoio nesse meu “preconceito” perante a cultura japonesa: comoção, poesia e índole teatral.

São quatro histórias familiares e íntimas, tão banais quanto frágeis passadas num café-meio-cave, singelo, discreto, escondido num beco da enorme cidade de Tóquio. Um café centenário que serve um requintado café personalizado, servido por um pequeno e silencioso núcleo familiar. Nas paredes estão expostos três relógios desacertados e as três únicas mesas do estabelecimento costumam estar ocupadas por clientes muito habituais. Um dia, um cronista de jornal descobriu que o local tem um compromisso com o Tempo. Ali, pode-se viajar nele, reconhecer o passado, espreitar o porvir mas quem o faz não pode mexer no presente.

Toshikazu Kawaguchi oferece-nos esse lado cinéfilo através das descrições dos que entram ou saem pela porta do café ou pela porta do Tempo; também o pendor dramático e teatral pois grande parte das histórias é contada através de diálogos; o lado poético porque o silêncio sublinha o lado quase resignação ou abandono dessa devoção amorosa pela ideia de família.

jef, maio 2024

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