sexta-feira, 26 de junho de 2020

Sobre o filme «A Via Láctea» de Luis Buñuel, 1969.










Filme teórico, erótico, louco e livre. Tudo o que aqui se diz e se olha está inscrito nas sagradas escrituras ou no seu contrário: as heresias, os anátemas, as maldições, os milagres, a devoção, a repugnância, o corpo, a alma, o sexo, a excomunhão. Temos de seguir João (Laurent Terzieff) e Pedro (Paul Frankeur) que vão em peregrinação de Paris a Compostela, em homenagem ao apóstolo Tiago que pode nem estar ali enterrado. Falam Cristo (Bernard Verley) que se prepara para rapar a barba, impedido pela Virgem Maria (Edith Scob) que se revela com um rosário no alto de uma árvore a uns estudantes jacobinos atónitos e convertidos (Denis Manuel, Daniel Pilon). Fala o diabo (Pierre Clémenti) que promove desastres rodoviários. Fala o devoto Marquês de Sade (Michel Picolli), a prostituta acolhedora (Delphine Seyring) e o padre do albergue espanhol ávido pelo divino voyeurismo (Julien Guiomar).

É uma espécie de testemunho religioso de Luis Buñuel a partir da sua própria leitura tão atenta das sagradas escrituras e de tudo o que elas provocam de confusão, interpretação, negação, olhado através de uma sucessão de quadros que aparecem sem regra geográfica ou temporal aos olhos dos peregrinos Pedro e João (e dos espectadores). Tal como as estrelas que parecem caóticas a quem as olha mas organizadas numa galáxia láctea e que levava os devotos pelas estradas até São Tiago, em Compostela.

Este filme é o absoluto oposto de «A Vida de Brian» dos Monty Phyton (1979).


jef, junho 2020

«A Via Láctea» (La Voie Lacteé) de Luis Buñuel. Com Paul Frankeur, Laurent Terzieff, Pierre Clémenti, Bernard Verley, Edith Scob, Denis Manuel, Daniel Pilon, Alain Cuny, François Maistre, Julien Bertheau, Michel Picolli, George Marchal, Jean Piat, Muni, Agnès Capri, Claudio Brook, Jean-Claude Carrière, Marcel Pérès, Delphine Seyring, Michel Eichéverry, Julien Guiomar. Argumento: Luis Bñuel e Jean-Claude Carrière. Fotografia: Christian Matras. França / Itália, 1969, Cores, 102 min.

 


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