segunda-feira, 13 de abril de 2015

Sobre o filme «Paisà - Libertação» (1946) de Roberto Rossellini


 

 

 
 
 
 
 
 
Rossellini equaciona o olhar do espectador.

Os parentes cairiam na lama se este filme fosse considerado como seis modos diversos de olhar a «aventura»? Claro que sim! É difícil ver «esta» Segunda Grande Guerra com o espírito mais lúdico de quem vai divertir-se para o cinema.

«Paisà» é um filme especial no pressuposto político de neutralizar o hediondo espírito belicista usando o confronto de ideias, de culturas e de estéticas. Facto muito caro à dialéctica e à cultura.

Mas como consegue o realizador a adesão a essa tese por parte do espectador num filme que é de ficção e que, ostensivamente, se desvia da realidade para melhor dela se aproximar? Exactamente pela gestão rigorosa da ordem de certo «cinema de aventuras», um dos mais velhos modos de contar uma história. O caminho faz-se da Sicília até à foz do rio Pó, cruzando os melodramas e a acção de rua, a sucessão de planos e contra-planos de fugas pelos telhados e perseguições em ruínas, entre correrias, escadas e becos, esquinas e tiroteios, entre planos captados no movimento real urbano e no teatro de marionetas, claro que o teatro não poderia faltar!, onde a comédia e o riso servem apenas para aliviar a dor insuportável e aprofundar a tragédia que voltará mais à frente … É esta também a ordem das odisseias humanas e literárias que, neste caso, desagua num momento único: a mais extraordinária, bela e sinistra mise-en-scène no rio Pó: barcos, homens, coragem, desespero e morte. Tudo se move como num baile negro. Nesse momento apocalíptico, alguém refere antes de cumprir o sacrifício humano: «Para construir a ordem nova é preciso destruir todos os sinais da anterior».

Estará a «ordem» da aventura de Rossellini a enviar algum sinal de alerta aos olhos do espectador na sala do cinema Nimas, em Lisboa, exactamente no dia de hoje?

jef, abril 2015

«Paisà - Libertação» (1946) de Roberto Rossellini. Com Carmela Sazio, Robert van Loon, Dots M. Jonhson, Gar Moore, William Tubbs, Harriet White, Dale Edmonds.

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