quinta-feira, 11 de maio de 2017

Sobre o filme «Fátima» de João Canijo, 2017.


















O cinema de João Canijo tem vindo a aprofundar um caminho que pode parecer paradoxal. Mas não é, de todo. «Noite Escura» 2004, «Sangue do Meu Sangue» 2011, «É o Amor» 2013. Ou, agora, «Fátima». Aprofundar a proposta de actrizes profissionais copiarem a realidade ou agirem como a realidade parece desenrolar-se: Realismo, Neo-realismo, Hiper-realismo. Actrizes de primeira água devem copiar os modos e as gentes, a fala, os risos, as angústias. Visconti e Rossellini fizeram o contrário com as gentes de Catania, na Sicília, ou de Stromboli. Colocaram o povo como actores à frente das câmaras. Os irmãos Dardenne, Abdellatif Kechiche, Asghar Farhadi ou Ken Loach refazem a história socio-política utilizando como pathos as situações mais comuns do dia-a-dia, angariando a adesão do espectador.
Contudo,  João Canijo não pretende (directamente) mudar o curso do mundo, fazer «política», nem copiar a realidade, produzir qualquer tipo de documentarismo emocional e diarista. «Fátima» é um filme cuja imensa história não tem praticamente história. Tudo é usado para dar emoção e suspense, sem buscar a moral para beliscar a fé popular ou acarinhar voyeuristas rancorosos da Cova da Iria. Tudo fica incólume, excepto o amor por aquelas mulheres em sofrimento, nervos e vontade.
Aqui o cinema é complexo, os travellings são longos, a voz off faz milagres e conta tudo o que ainda não foi entendido. A captação de som é única. Enfim, praticamente, nada mais há senão devoção e catarze. E uma representação ao nível do sublime daquelas onze mulheres.
Não sou crente mas emocionei-me. Que grande peça de teatro fora de palco!
«Fátima», um filme para quem tiver um pingo de sensibilidade e outro de curiosidade pela origem do mais fundo e abstracto sentimento emocional do homem.

jef, abril 2017


«Fátima» de João Canijo. Com Anabela Moreira, Rita Blanco, Teresa Tavares, Ana Bustorff, Teresa Madruga, Sara Norte, Márcia Breia, Cleia Almeida, Vera Barreto, Alexandra Rosa, Irís Macedo. França / Portugal, 2017, Cores, 153 min.

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