quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Sobre o filme «Aquela Loira» de Jacques Becker, 1952





















É muito interessante como os Cahiers du Cinéma e a Nouvelle Vague adoptaram este filme como seu patrono e, ao mesmo tempo, se desculpam pelo facto de o apreciarem. George Sadoul, quando escreve, parece fazer o mesmo. «Desculpem-nos mas, apesar de tudo, apesar do classicismo romântico à Donizetti, Verdi ou Bizet, apesar da camada moral que lhe está subjacente, apesar do amor trágico contado de modo tão sumário, linear e eficaz, nós gostamos deste filme!»
Curioso, mesmo, pois este filme tem um encanto pouco «americanizado», de estética «cordial», sem saltos na narrativa ou «incompreensíveis» aproximações a objectos modernos ou personagens «descentradas» da câmara abraçando o existencialismo.

Aqui há o modo tão ao jeito da Carmen, do Romeu e Julieta ou do «West Side Story / Amor Sem Barreiras» (Jerome Robbins, Robert Wise, 1961), de levar o espectador a acreditar no primeiro instante na tragédia que vai assistir, colocando-lhe o olhar sobre um belíssimo e luminoso casal, quais aristocratas a fazer de prostituta e rufia, Casque d’Or (Simone Signoret) e Manda (Serge Reggiani), num diálogo que vai sendo reduzido ao mínimo para que as expressões ampliem a capacidade de comunicação teatral. Para que o «pathos» venha tocar o coração do espectador em definitivo.

Contudo, a sequência das cenas é sempre tão esteticamente exagerada, tão sintética ou «impressionista» sobre a paisagem, tão estática sobre os rostos, prendendo o outro olhar do espectador ao movimento narrativo que, de certo modo, é fácil compreender a razão pela qual a Nouvelle Vague se apaixonou pelo filme. A chegada das barcaças enquanto se ouve a alegre canção sobre a moleira e o moinho, a altercação entre rufias na esplanada que vai desencadear o romance, o rodopio dos dançarinos, a fuga para a casa de campo, a fuga do carro penitenciário, a cena-armadilha em que cai Manda na esquadra da polícia, quase suicida. A cena brutal que antecede o desfecho.

Tudo neste filme carece de  uma segunda análise, uma segunda chance, um segundo olhar apaixonado.

A Nouvelle Vague é a rainha do múltiplo!

jef, agosto 2018

«Aquela Loira» (Casque d’Or) de Jacques Becker. Com Simone Signoret, Serge Reggiani, Claude Dauphin, Raymon Bussières, Odette Barencey, Loleh Bellon, Solange Certon, Daniel Mendaille, Dominique Davrray, Jacquelini Dane, Paul Barge. Fotografia: Robert Lefèvre, Música: Georges Van Parys. França, 1952, Preto e Branco, 96 min.

Sem comentários:

Enviar um comentário