segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

Sobre o filme «Fechar os Olhos» de Víctor Erice, 2023



 
















Este filme é estranho. Realizado mais de 30 anos depois de «O Sol do Marmeleiro» (1992), um dos filmes que jamais esquecerei pela genial candura como Víctor Erice oferece ao pintor Antonio Lopez, o tempo, a beleza e o silêncio da espera. E nos ensina a contemplar a vida como se disfruta de uma natureza-morta exemplar.

Por isso, preparei-me para um novo deslumbramento que logo aconteceu na pausa inicial em que nos são dadas ver as cenas iniciais de um filme que está a ser realizado por Miguel Garay (Manolo Solo) e onde nos é apresentado o pedido de um velho aristocrata judeu em fim de vida, Mr. Levy (Josep Maria Pou), a um investigador privado para que encontre e traga à sua presença a filha que terá deixado no Extremo Oriente. Porém, tudo fica interrompido pois o actor e amigo de longa data do realizador, Julio Arenas (José Coronado), desaparece sem deixar rasto antes de serem concluídas as filmagens.

Uma investigação televisiva vem reacender o mistério e devolve a Miguel Garay a vontade de tentar desvendar o desaparecimento do seu amigo e cúmplice de amores e desamores.

Estão lançados os dados através de uma tranquila mas profunda reflexão sobre o tempo que passa sem deixar rasto, o fim do cinema, a busca da identidade e a liberdade de desaparecer. Tudo se move em torno de uma ausência e da perspectiva do final de linha. Para que servirá continuar a tentar se nos é dada a liberdade de mudar de estação e fugir? Se também temos a opção de obliterarmos a memória?

Tudo é interrogado através de uma história extraordinariamente bem contada e por personagens profundamente construídos e bem caracterizados. Tudo é nostálgico e belo.

Contudo, à medida que o filme caminha para o fim, a narrativa parece começar a ficar presa em pormenores cada vez mais factuais, digamos novelescos para não dizer televisivos, e fui perdendo a poesia que no início me entregaram como fulcro do enredo. E a cena final, em jeito de «Cinema Paraíso» (Giuseppe Tornatore, 1988), é lenta, muito lenta, e desfaz um pouco a aura misteriosa que desde o início fora prometida.

Mas ainda é uma grande filme, uma bela tarde de cinema.


jef, dezembro 2023

«Fechar os Olhos» (Cerrar los ojos) de Víctor Erice. Com Manolo Solo, José Coronado, Ana Torrent, Petra Martínez, María León, Mario Pardo, Helena Miquel, Antonio Dechent, Josep Maria Pou, Soledad Villamil, Juan Margallo, Dani Téllez, Alejandro Caballero Ramis, Rocío Molina, Ana María, José Manuel Mansilla, Kao Chenmin, Venecia Franco, Fulgencio Javier, Natalia Llorens. Argumento: Víctor Erice e Michel Gaztambide. Produção: Víctor Erice, José Alba, Odile Antonio-Baez, Agustin Bossi e Pablo Bossi. Fotografia: Valentín Álvarez. Música: Federico Jusid. Espanha / Argentina, 2023, Cores, 169 min.

 

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