Aparentemente,
todas as personagens femininas de Rohmer são pessoas comuns, que estudam numa
faculdade de arte em Paris, trabalham num antiquário, guiam uma Renault 4L,
vivem com a mãe e a irmã perto de Le Mans. Como Sabine (Béatrice Romand) que
resolve casar sem ainda ter qualquer noivo em vista. Não quer continuar a
partilhar a vida com um homem casado com filhos e vida própria, como o pintor Simon
(Féodor Atkine). Sabine leva a sua teoria avante com a ajuda da sua melhor
amiga Clarisse (Arielle Dombasle).
Aparentemente,
todas as casas por onde circulam as personagens de Rohmer parecem ligeiramente
acanhadas, despreocupadas, com um interruptor a precisar de quem o aparafuse à
parede, que faça as camas ou lhe dê uma limpeza.
Aparentemente,
os bailes onde dançam as suas personagens, olhando de soslaio os parceiros, parecem
simulacros teatrais onde os actores se movem, ansiando, desejando, retraindo-se, num à vontade vigiado de festa de aldeia.
Porém,
Éric Rohmer coloca todas as personagens comuns a discursarem como ninguém
discursa dento de um Renault 4L; circulando com perfeito à vontade em cenários exíguos
para que os olhares se confrontem ou, ostensivamente, se neguem; dançando como só os grandes actores conseguem mal dançar para concentrar e sublinhar os seus desejos, a sua ansiedade.
Por
ora, Sabine pode efectivamente não levar a sua avante mas o instinto
permanece-lhe vigilante e um comboio sempre foi um espaço acanhado, propício
que os olhares se voltem a cruzar. Acima de tudo, numa óptica filosófica.
jef,
outubro 2021
«O
Bom Casamento» (Le Beau Mariage) de Éric Rohmer. Com Béatrice Romand, André
Dussollier, Féodor Atkine, Arielle Dombasle, Huguette Faget, Thamila Mezbah, Sophie
Renoir, Hervé Duhamel, Pascal Greggory, Virginie Thévenet, Denise Bailly, Vincent
Gauthier, Anne Mercier, Catherine Rethi, Patrick Lambert. Argumento: Éric
Rohmer. Produção: Margaret Ménégoz. Fotografia: Bernard Lutic. Música: Ronan
Girre, Simon des Innocents. França, 1982, Cores, 93 min.
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