sexta-feira, 11 de novembro de 2022

Sobre o filme «O Medo Come a Alma» de Rainer Werner Fassbinder, 1973































Um dos filmes mais intensamente políticos sobre o amor. Ou como R.W. Fassbinder transforma a realidade para que esta adquira a sua mais real profundidade e nos leve a acreditar que a arte é um dos grandes êmbolos ou alavanca com energia suficiente para modificar a sociedade.

O caso parece ter mesmo acontecido, tendo sido noticiado, mas o desfecho é muito mais cruel do que o da história que o realizador conta.

Emmi (Brigitte Mira), mulher com idade para ser avó, empregada de limpeza, é levada até a casa, num dia de chuva, por um jovem negro, imigrante marroquino, gentil e cerimonioso, Ali (El Hedi ben Salem), a trabalhar numa oficina de automóveis. A noite passa-se carinhosamente pois os transportes já não podem levar Ali de volta até casa. Emmi e Ali apaixonam-se. Emmi e Ali resolvem casar-se. Emmi e Ali casam-se.

Mas a sociedade não está preparada para aceitar um amor assim.

Em apenas hora e meia e numa cronologia cénica e dramática rigorosa, bela e perfeita, não só vemos o efeito da sociedade sobre o inusitado casal, como assistimos ao que, dentro de cada um, de Emmi e de Ali, se vai transformando. A relação com as colegas de trabalho e a família de Emmi, a masculinidade e a úlcera de estômago de Ali. As relações laborais, de vizinhança, o racismo, o envelhecimento, a sociedade que dever ser muito mais produtiva do que afectuosa.

Tudo dito de um modo simplesmente belo, sem rodriguinhos de encenação, sem palavras a mais, com os silêncios certos, num palco discretamente exuberante.

Tudo ali conta.

Um filme que devia ser levado à cena em todas as escolas e universidades.

Um filme a ser guardado no coração.


jef, novembro 2022

«O Medo Come a Alma» (Angst essen Seele Auf) de Rainer Werner Fassbinder. Com Brigitte Mira, El Hedi ben Salem, Barbara Valentin, Irm Hermann, Elma Karlowa, Anita Bucher, Gusti Kreissl, Doris Mattes, Margit Symo, Katharina Herberg, Lilo Pempeit, Peter Gauhe, Marquard Bohm, Walter Sedlmayr, Hannes Gromball, Hark Bohm, Rudolf Waldemar Brem, Karl Scheydt, Ingrid Caven, Kurt Raab, Rainer Werner Fassbinder. Argumento: Rainer Werner Fassbinder. Fotografia: Jürgen Jürges. Cenários: Kurt Raab, Rainer Werner Fassbinder. RFA, 1973, Cores, 93 min.

 

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