Estas
crónicas realistas situam-se entre Janeiro de 2030 e Outubro de 2054. Mas
dir-se-ia que foram escritas para serem lidas em Outubro de 2024. Um
anacronismo histórico e futurista de que Ray Bradbury é exímio.
Um
facto é que tudo começa por um Verão extemporâneo provocado pelo lançamento de
um foguetão, no Inverno. Enfim, imaginárias alterações climáticas. Depois vêm
os sonhos mais ao menos húmidos, mais ou menos desiludidos, da Senhora K onde
alguém, de olhos azuis, canta velhas canções inglesas. Nathaniel York. O
planeta das montanhas azuis está prestes a receber a visita de humanos
terrestres. Depois chegam o capitão Williams e o capitão John Black. Mais tarde
chegam humanos aos milhares, aos milhões. A invasão de Marte aniquila os
autóctones, ou deixa uns poucos a pairarem em leves esferas azuis para lá das
montanhas. Extermínio ou aculturação ou gentrificação. O planeta seguinte enche-se
de homens que fogem da sua humanidade. Podem, agora, do planeta Azul ter uma
visão ampla do planeta Verde que deixaram. Porém, este definha com a ameaça de
uma guerra nuclear total… Coisas imaginadas!
Enfim,
Ray Bradbury apaixonado pelo antigo Egipto e por Edgar Allan Poe assume nestas
crónicas a verdadeira condição humana, entre o humor, a tragédia e o eterno esquecimento.
E o tempo, aqui, é coisa abastracta, logo sem relógio ou calendário
estabelecidos.
Livro
maravilhoso e premonitório. Nem o próprio Ray Bradbury imaginaria. Tirem-no da
secção “Ficção Científica” e coloquem-no em “Ensaio Histórico e Social”. Uma
pérola de profunda ironia, sarcasmo benevolente e ternura pelo bicho-homem, esse
que é eternamente irresponsável, eternamente infantil. Mas também potencialmente
amorável.
jef,
setembro 2024
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