Na
varanda sobre o Índico todos são prisioneiros. A Fortaleza de São Nicolau é uma
irremediável tumba, cárcere, asilo, paiol, ilha rodeada de passado e de mar por
todos os lados. Também de história, guerra e malfeitoras. Também de amor,
silêncio e sorrisos. Parece que o autor encafuou todo o continente moçambicano
dentro das muralhas daquele minúsculo lar para idosos. Uma espécie de terreiro ou
vaso onde pernoita o aroma das flores de uma única árvore – o frangipani. Um espaço
onde se vão acumulando as escamas de um tal pangolim, animal de estimação do
futuro que durante as chuvadas surge para contar as novidades.
Afinal, irá chegar Izidine Naíta, um polícia de investigação que tenta encontrar suspeitos
pela morte inexplicada de Vasto Excelêncio cujo corpo terá ficado entre marés,
água salgada e pedregulhos. Contudo, aquele apenas possui seis dias de
investigação e transportará no interior o morrediço Ermelindo Mucanga, um
pré-falso-herói-morto que com relutância volta ao mundo dos vivos. Enfim, a
relutância esvai-se quando o corpo do polícia faz a alma de Ermelindo
aproximar-se da beleza da enfermeira Marta Gimo.
Tudo
resto está contido nos depoimentos realizados pelos velhos e pelas velhas, falsos
viventes porque prisioneiros dos seus próprios corpos.
Um
romance que faz de Moçambique uma espécie de jardim interior, a fortaleza de
São Nicolau, formoso e habitado por morcegos e andorinhas, contido na redoma da
sua imaginativa crença animista e de um passado ecológico e poético.
jef,
outubro 2024
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