quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Sobre o filme «O Quadrado» de Ruben Östlund, 2017
















O mais interessante no filme é a gestão do suspense criado no espectador, despoletado pelo stress, pela angústia, pela ansiedade, do personagem principal Christian (Claes Bang). E Christian, com a fleuma possível, assim, atirado para o meio do conflito do qual ele poderá ser culpado mas jamais incriminado. Ele está inocente, é um homem bom no centro de azares consequentes que convivem apressados no interior de uma comédia sobre a arte contemporânea, as suas curadoria e divulgação, a liberdade de expressão, a sobrevivência económica da estética apesar dos mecenas.

Um filme que é como as matrioskas russas. Um filme onde não sabemos se devemos rir com o inicial desastre ocorrido com a estátua que está a ser removida da praça central para dar lugar a «O Quadrado», ou, pelo contrário, se nos devemos afligir com a claustrofobia vertiginosa e magnificamente filmada dos vãos de escadas e degraus percorridos em pulsão de fugitivo ou pesar de condenado. Lembro «Vertigo» de Hitchcock (1958), um dos melhores filmes de sempre!

A arquitectura dos enquadramentos e decores é de um rigor estético que deixa o espectador dentro da realidade encenada dos cenários e que se torna um dos factores mais surpreendentes do filme. Mais artístico, digamos.

A interpretação das três crianças é qualquer coisa que está no limbo do inacreditável. Tal como em «Força Maior» (2014), a questão infantil tem o papel central no desenvolvimento da desconfiança e, por reflexo, da inquietude demonstrada pelos adultos. Ruben Östlund é excelente a revelar as fraquezas dos adultos tornados crianças instáveis e medrosas, como fora Michael Haneke em Brincadeiras Perigosas (1997) ao colocar a adolescência no limite adulto e abstracto do terror.

Contudo, a última matrioska, a crítica maior sobre a divulgação e banalização da arte contemporânea e do respectivo sustento financeiro e do seu confronto com a liberdade criativa, fica pelo caminho, entre alguns sorrisos, talvez gargalhadas, e algumas frases já muito vistas. Será esse também um outro ponto de conflito intencional do realizador? Porque em 1917, Marcel Duchamp fez melhor com aquele objecto de porcelana branca a que chamou «A Fonte» e que algum júri de concurso rejeitou por não incluir qualquer labor artístico.

jef, dezembro 2017

«O Quadrado» (The Square) de Ruben Östlund. Com Claes Bang, Elisabeth Moss, Dominic West, Terry Notary, Christopher Læssø. Palma de Ouro 70º Festival de Cannes. Suécia, Dinamarca, Alemanha, Reino Unido, 2017, Cores, 142 min.

Sem comentários:

Enviar um comentário