Espuma, Ruído e Atonia (2020–2025)
Paulo Romão Brás
O tempo e a sua estrutura.
Feita de atmosfera, a estrutura da espuma está
suspensa entre a química das moléculas e as forças da respectiva física. A
espuma é uma espécie de nada que se pulveriza com o tempo. Quando observada de
perto, tem a sua arte. Efémera.
Existe uma frase repetida de Schopenhauer que diz que
a música traduz a maior filosofia através de uma linguagem que a razão não
compreende. O ruído, tal como a música, é igualmente uma ligação irracional,
com uma estrutura ainda mais incompreensível, que o tempo não consegue aprisionar
idiomaticamente, fazendo-o desaparecer no momento imediato.
Por outras palavras, tanto a espuma como o ruído (e a
música) sofrem de acentuada atonia, de uma lassidão atómica, de uma fraqueza
muscular. Não se podem esculpir, polir, agarrar e colocar sobre o aparador para
que as visitas, convidadas para o jantar, possam admirar.
A arte e o seu tempo.
A obra de Paulo Romão Brás contraria essa vacuidade
temporal, surgindo como se de um pêndulo a oscilar se tratasse,
sistematicamente, entre a sombra que surge da profundidade da fotografia
rasurada e o brilho definido pela cor solar. Os limites de um recorte
planificado a duas dimensões, por uma colagem imposta pelas matérias física e
digital. Penumbra e contorno, sombra e colorido, balançando com o pêndulo do
relógio de parede exposto na sala.
O tempo com o seu tempo.
Kurt Schwitters, nos anos 40 do século XX, riscava já
o tempo com a arte, colando figuras e letras, refazendo o abecedário da
pintura, castigando a textura da própria evolução artística, hostilizando o
expressionismo, o cubismo, o dadaísmo. Kurt Schwitters provoca o minuto
presente no seu quotidiano.
Ao contrário, «Espuma, Ruído e Atonia», apresentando
24 obras realizadas entre os anos 2020 e 2025, está bem ciente do minuto que a
assiste, sublinhando-o, não o provocando. Estas obras redefinem o limite dos
espaços e a sólida arquitectura das linhas de fuga que vêm de um passado
assumido. Relembre-se «Coisa Perene Entre a Casa e o Crânio» (Galeria do IAC,
Angra do Heroísmo, 2019), «O Ciclo Curvo das Noites» (A Morte do Artista, 2019)
ou «Camera» (LP, Knok Knok, 2024).
A arte com a sua arte. A função estruturalista.
Com «Espuma, Ruído e Atonia», Paulo Romão Brás não
pretende quebrar o vidro do relógio, antes convidar-nos a relembrar um tempo em
que o artista e sua arte estiveram confinados epidemiologicamente,
clinicamente. Um tempo em que o tempo ficou sem estrutura, parado, mas onde a
função do homem como artista esteve a cargo do mundo que o envolve, por
sistema. Ou seja, pela ética, ou melhor pela respectiva linguagem comum, a que
se pode chamar: Estética.
Sintam-se convidados. O jantar é servido.
Biblioteca Camões, Lisboa
Inauguração: 22 de maio de 2025 (quinta-feira) - 18:30.
Patente até 20 de junho de 2025
jef, 18 de maio de 2025
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