quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Sobre o filme «Happy Hour: Hora Feliz» de Ryûsuke Hamaguchi, 2015
















Este filme é estranho.
Deixa-nos uma sensação de incómodo, distância, silêncio agressivo. A impressão de que estamos a olhar a sociedade através da lupa lenta e minuciosa de um etólogo ou antropólogo que estuda o aquário, o terrário, o jardim zoológico, a cidade.

Quatro amigas de longa data vão descobrindo, revelando, falando, rodando sobre si próprias, circulando numa vida que parece esconder uma conclusão. Ou um início. Todas andam em suspenso, na dependência do modo masculino, aceitando-o ou rejeitando-o, mas evitando o diálogo ou o confronto.

As refeições terminam invariavelmente com segredos afirmados de modo confrangedor. São todos educadamente inconvenientes. Claro que as actrizes que interpretam Akari, Sakurako, Fumi e Jun, respectivamente Sachie Tanaka, Hazuki Kikuchi, Maiko Mihara, Rira Kawamura, merecem totalmente os prémios que receberam por darem corpo a personagens à beira de uma ruptura tão «reprimida», numa sociedade tão «intocável», com um percurso de cedência perante a revolta que não consegue mais ser reprimida.

Contudo, repito, fico com a estranha sensação de ter assistido a uma simples cine-novela de 5 horas e 17 minutos de duração, onde «tudo» anda em torno de um certo «quase nada».

Talvez defeito meu.

Que saudades fiquei de Hirokazu Koreeda, Takeshi Kitano, Akira Kurosawa, Nagisa Oshima, Yasujiro Ozu, Kenji Mizoguchi, que nos fazem crer que o Japão  
é um poço emocional de criatividade, as suas refeições um polo delicado de afecto e compreensão, que a sua tradição histórica, por mais diferente que seja, transporta-nos para o coração estético de uma humanidade que é una e indivisível.

Nota: a banda sonora é fantástica!

jef, outubro 2018

«Happy Hour: Hora Feliz» (Happî awâ) de Ryûsuke Hamaguchi. Com Sachie Tanaka, Hazuki Kikuchi, Maiko Mihara, Rira Kawamura. Japão, 2015, Cor, 317 min.

Sem comentários:

Enviar um comentário