Como
uma ópera dramática, romântica, seguindo a ondulação do texto sempre cantado, sempre
atrás da previsível tragédia. Ninguém já é dono de nada. Todos estão em desequilibrio.
Guilbaud (Richard Berry), o operário metalúrgico está em greve e desempregado,
não ama Violette (Fabienne Guyon) mas ela está muito feliz. Edith (Dominique
Sanda) entra em ruptura total com o marido Edmond (Michel Piccoli), acusando-o
de impotência e consequente prepotência. Edith prostitui-se por vingança e uma
cartomante determina que um dia breve ela se apaixonará loucamente por um
metalúrgico.
Tudo
se passa entre duas ruas, duas casas, um bar, a loja de conserto de televisores
de Edmond, o pátio onde os piquetes de greve fazem vigilância. Cores operáticas
dos cenários e do guarda-roupa a contrastar com os temas musicais quase obscuros.
No centro da história, e como anti-clmax permanente, situa-se a casa onde vive Margot
Langlois (Danielle Darrieux), mãe de Edith, viúva diletante, entediada, quantas
vezes risível, de copo de branco na mão, burguesa a sonhar com a tranquila vida
passada, quando a burguesia era verdadeira e não “pequena”, quando o odioso
marido e o pobre filho eram vivos, quando podia abrir a janela e respirar. O
oposto daqueles dias (de 1955), em que o ar andava empestado do gás lacrimogéneo
que a polícia lançava sobre os grevistas. Uma época em que não precisava de
alugar um quarto. E logo a um operário metalúrgico. Precisamente a Guilbaud!
Como
na ópera Verdiana toda a intriga e a comoção são levadas através dos desencontros
instantâneos, da cena e da contracena, de silêncios e omissões, pelos desacertos
emocionais, pela impossibilidade das relações. Pela ordem maior do palco
e do teatro!
Uma
ópera romântica, desabrida, minuciosa, inverosímil para a época em que foi realizada. Uma ópera
belíssima e inclassificável.
jef,
janeiro 2025
«Um
Quarto na Cidade» (Une Chambre en Ville) de Jacques Demy. Com Dominique Sanda,
Richard Berry, Danielle Darrieux, Michel Piccoli, Fabienne Guyon, Anna Gaylor, Jean-François
Stévenin, Jean-Louis Rolland, Marie-France Roussel, Georges Blaness, Yann Dedet,
Nicolas Hossein, Gil Warga, Antoine Mikola, Marie-Pierre Feuillard, Monique
Créteur, Patrick Joly. Argumento: Jacques Demy. Produção: Christine Gouze-Rénal. Fotografia: Jean
Penzer. Música: Michel Colombier. Coreografia: Norman Maen. Guarda-roupa: Rosalie
Varda. França, 1982, P/B, 88 min.
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