terça-feira, 14 de janeiro de 2025

Sobre o filme «Um Quarto na Cidade» de Jacques Demy, 1982



 




























Como uma ópera dramática, romântica, seguindo a ondulação do texto sempre cantado, sempre atrás da previsível tragédia. Ninguém já é dono de nada. Todos estão em desequilibrio. Guilbaud (Richard Berry), o operário metalúrgico está em greve e desempregado, não ama Violette (Fabienne Guyon) mas ela está muito feliz. Edith (Dominique Sanda) entra em ruptura total com o marido Edmond (Michel Piccoli), acusando-o de impotência e consequente prepotência. Edith prostitui-se por vingança e uma cartomante determina que um dia breve ela se apaixonará loucamente por um metalúrgico.

Tudo se passa entre duas ruas, duas casas, um bar, a loja de conserto de televisores de Edmond, o pátio onde os piquetes de greve fazem vigilância. Cores operáticas dos cenários e do guarda-roupa a contrastar com os temas musicais quase obscuros. No centro da história, e como anti-clmax permanente, situa-se a casa onde vive Margot Langlois (Danielle Darrieux), mãe de Edith, viúva diletante, entediada, quantas vezes risível, de copo de branco na mão, burguesa a sonhar com a tranquila vida passada, quando a burguesia era verdadeira e não “pequena”, quando o odioso marido e o pobre filho eram vivos, quando podia abrir a janela e respirar. O oposto daqueles dias (de 1955), em que o ar andava empestado do gás lacrimogéneo que a polícia lançava sobre os grevistas. Uma época em que não precisava de alugar um quarto. E logo a um operário metalúrgico. Precisamente a Guilbaud!

Como na ópera Verdiana toda a intriga e a comoção são levadas através dos desencontros instantâneos, da cena e da contracena, de silêncios e omissões, pelos desacertos emocionais, pela impossibilidade das relações. Pela ordem maior do palco e do teatro!

Uma ópera romântica, desabrida, minuciosa, inverosímil para a época em que foi realizada. Uma ópera belíssima e inclassificável.


jef, janeiro 2025

«Um Quarto na Cidade» (Une Chambre en Ville) de Jacques Demy. Com Dominique Sanda, Richard Berry, Danielle Darrieux, Michel Piccoli, Fabienne Guyon, Anna Gaylor, Jean-François Stévenin, Jean-Louis Rolland, Marie-France Roussel, Georges Blaness, Yann Dedet, Nicolas Hossein, Gil Warga, Antoine Mikola, Marie-Pierre Feuillard, Monique Créteur, Patrick Joly. Argumento: Jacques Demy. Produção: Christine Gouze-Rénal. Fotografia: Jean Penzer. Música: Michel Colombier. Coreografia: Norman Maen. Guarda-roupa: Rosalie Varda. França, 1982, P/B, 88 min.

 

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