quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

Sobre o filme «Lola» de Jacques Demy, 1961



 




























Parece ser a definição de Amor, este filme. De um amor desejado, sonhado e, por fim, conquistado. Daí, o happy end, apesar de tudo. E Jacques Demy define o Amor através de Lola (Anouk Aimée), através desse ‘apesar de tudo’, apesar desse ‘happy end’. Lola vive, Lola corre, Lola espera. Lola ri e ama, maternalmente. E todos chegam e depois todos partem. A solidão parece ser um espectro a pairar… O provérbio chinês dá o mote: ‘Ri quem quer, chora quem pode’.

«Lola» é como o corolário de um cinema passado e futuro. É dedicado a Max Ophüls e o cabaret onde Lola trabalha assemelha-se ao ninho de afecto e de amor de «La Maison Téllier» de Ophüls / Maupassant («Le Plaisir» 1952), Lola é um nome que evoca Marlene Dietrich em «O Anjo Azul» (Josef von Sternberg, 1930). Lola corre como Anna Magnani em «Belíssima» (Luchino Visconti, 1951) ou Gena Rowlands em «Glória» (John Cassavetes, 1980). É quase um filme musical à Hollywood mas onde tudo é feito numa espécie de Nouvelle Vague carinhosa.

O movimento incessante da câmara atrás das imparáveis personagens que circulam pelos cenários de Nantes, lembrando os filmes de Jean Renoir ou Jean-Luc Godard. Todos se cruzam (ou quase se cruzam) numa espécie de alegre tristeza pontuada pelas canções de Michel Legrand, pelo dramatismo da sétima sinfonia de Beethoven, pela agitada suavidade de Bach ou Mozart.

O espampanante e descapotável carro de Michel (Jacques Harden) – a lembrar certos filmes de Wim Wenders – abre e fecha o filme em sentidos contrários aos dos passos levados pelo desempregado e filosófico Roland Cassard (Marc Michel), do marinheiro Frankie (Alan Scott), da jovem apaixonada e fugitiva Cécile (Annie Duperoux) e da mãe desta (Elina Labourdette) que também foge encurralada pelo destino. A guerra a pairar como motor da separação, as diferenças sociais como fatalidade para os desencontros.

Aqui, as personagens são belas, bondosas e enternecedoras. Ninguém é mau. Anseiam apenas melhor para a vida e para os outros. É impossível não nos apaixonarmos por todas elas. Difícil esquecermos Lola.

Digamos que «Lola» toca uma Nouvelle Vague mas caridosa, enciclopédica e expressionista.


jef, janeiro 2025

«Lola» de Jacques Demy. Com Anouk Aimée, Marc Michel, Jacques Harden, Alan Scott, Elina Labourdette, Margo Lion, Annie Duperoux, Catherine Lutz, Corinne Marchand, Yvette Anziani, Dorothée Blanck, Isabelle Lunghini, Annick Noël, Ginette Valton, Anne Zamire, Jacques Goasguen, Babette Barbin, Jacques Lebreton, Gérard Delaroche. Argumento: Jacques Demy. Produção: Georges de Beauregard e Carlo Ponti. Fotografia: Raoul Coutard. Música: Michel Legrand. Guarda-roupa: Bernard Evein. França / Itália, 1961, P/B, 83 min.

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