terça-feira, 5 de julho de 2022

Sobre o filme «A Lei de Teerão» de Saeed Roustayi, 2019


















Não há tempo a perder.

As cenas iniciais de fuga desesperada do traficante perseguido pelo polícia Hamid (Houman Kiai) terminam de modo brutal. Será uma das histórias que fará correr ainda mais o incorruptível Samad (Payman Maadi) buscando provas e colocando questões ao juiz (Farhad Aslani), tentando desenrolar o novelo da lei iraniana que condena à morte tanto o maior traficante como o mais insignificante. Pelo meio, vai ficando a queda do procurado dealer Naser Khakzad (Navid Mohammadzadeh) que se deita calçado, não consegue dormir sem comprimidos, protege a família com unhas e dentes e é traído pela ex-namorada lavada em lágrimas, Elham (Parinaz Izadyar).

Tudo o resto é a excepcional encenação cinematográfica sustentando esse número incompreensível que dá o título internacional ao filme: «Just 6,5»! São 6,5 milhões de iranianos envolvidos na síntese, no tráfico e no consumo de droga.

Este diabólico thriller de acção surge como uma verdadeira ópera onde o coro imenso e miserável de centenas de drogados famintos fazem de regra e contra-regra, num palco sumptuoso apesar de exíguo, ao ininterrupto diálogo dos actores que se iludem perseguindo uma verdade que dificilmente sairá vencedora. Esses famélicos não são actores, são mesmo os desesperados iranianos que a droga e a sua lei remete para o esgoto da cidade.

Não há mesmo tempo a perder. Não podemos deixar de seguir o diálogo imparável e os cenários de cores, tons e padrões magníficos. Mas profundamente tristes. Também o sentido operático vem daí, desse subterrâneo ímpar, sujo, esventrado.

E como consegue o realizador, sobre tudo isto, ainda colocar o ridículo irónico, que faz sorrir ante o climax final, tão soturno quanto medonho?

Não há tempo a perder porque devemos tudo olhar (já que não somos falantes de iraniano).

Aqui, não temos mesmo tempo a perder porque não podemos desviar a consciência do olhar.

Um filme imprescindível.

Um filme belo que me ficará na memória, junto do coração, como aqueles outros vindos do grande cinema do Irão: «Close Up» e «Shirin» de Abbas Kiarostami (1990, 2008), «O Círculo» e «Taxi» de Jafar Panahi (2003, 2015) ou «Uma Separação» de Asghar Farhadi (2011).


jef, junho 2022

«A Lei de Teerão» (Metri Shesh Va Nim / Just 6.5) de Saeed Roustayi. Com Payman Maadi, Navid Mohammadzadeh, Parinaz Izadyar, Farhad Aslani, Houman Kiai, Maziar Seyedi, Ali Bagheri, Marjan Ghamari, Yusef Khosravi, Amir Hossein Mirchi, Mehdi Hoseini-nia, Giti Ghasemi, Asghar Piran, Mohammad Ali Mohammadi, Peyman Ghasemzadeh, Javad Pourheidari. Argumento: Saeed Roustayi. Produção: Seyed Jamal Sadatian, Arastoo Sohrabinya, Mohammad Sadegh Ranjkeshan. Fotografia: Hooman Behmanesh. Música: Peyman Yazdanian. Irão, 2019, Cores, 135 min.

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