Quando
se tem na memória os filmes monumentais sobre a monumental catástrofe da
humanidade – «Noite e Nevoeiro» (Alain Resnay, 1956) ou «Shoah» e «Sobibor, 14
de Outubro 1943, 16 Horas» (Claude Lanzmann, 1985, 2001), é bem provável que
entremos no cinema com um pé atrás e a condição comparativa em estado de
alerta. Contudo, quando se vê a alegoria iraniana «III Guerra Mundial» (Houman
Seyedi, 2022), acreditamos que o cinema ficcional (e não documental) ainda pode
pegar no Tema sem ofender essa minha memória informativa, formativa, adquirida e
fundamental. Tenho para mim que o cinema apenas pode tocar no monstro com as pinças da
sensibilidade, da estética e da ética.
Por isso, este filme arrepiou-me.
Sugeriu-me ser uma comédia a fingir que é tragédia,
pouco séria e confusa, infeliz e perigosa, a roçar a morbidez apenas para chocar
e dar um certo ar “gore” para apresentar-se moderninha e violenta, como agora
está tão na moda ser a “arte contemporânea”. E, como é óbvio, para piscar o olho aos Óscares.
Para
quê a memória “polaca” em formato negativo e com a jovem resistente a distribuir frutos pelos escombros, pelas cinzas, ainda a descobrir a pauta de uma possível canção de
resistência?
Porquê
filmar assim, sem decoro, estética ou reverência, fazendo mover aspiradores pela
actual memória dos calabouços de Auschwitz?
Para
quê a consulta médica e os vómitos inconsequentes de Rudolf
Höss (Christian Friedel)? (Eu sei que em ficção tudo pode coexistir mas quem conseguiria respirar alegremente paredes meias com as chaminés dos fornos crematórios?)
Tento
reavaliar a minha memória através dos velhos filmes, dos livros e da música. Vou
buscar sem demora o disco «Terezín / Theresienstadt» com Anne Sofie von Otter,
Bengt Forsberg, Christian Gerhaher, Daniel Hope (Deutsche Grammophon, 2007)
Tento
esquecer o filme.
Vou
já ler «Se Isto é Um Homem» de Primo Levi (1947).
jef,
fevereiro 2024
«A
Zona de Interesse» (The Zone of Interest) de Jonathan Glazer. Com Sandra
Hüller, Christian Friedel, Freya Kreutzkam, Ralph Herforth, Max Beck, Ralf
Zillmann, Imogen Kogge, Stephanie Petrowitz, Johann Karthaus, Marie Rosa
Tietjen, Luis Noah Witte, Nele Ahrensmeier, Andrey Isaev, Medusa Knopf, Julia
Polaczek, Daniel Holzberg, Zuzanna Kobiela, Martyna Poznanski. Argumento: Jonathan
Glazer baseado no romance de Martin Amis. Produção: Ewa Puszczynska e James Wilson. Fotografia:
Lukasz Zal. Música: Mica Levi. EUA / Reino Unido / Polónia, 2023, Cores, 104
min.
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