quarta-feira, 16 de julho de 2025

Sobre o livro «O Clube do Crime das Quintas-Feiras» de Richard Osman, Planeta, 2021. Tradução de Rui Azeredo.


Existirá um padrão para o humor criativo britânico? Poderemos conceber um modo de “livro policial”?

Após ler este, surge-me um definido “sim” para o primeira e um “não” tímido para a segunda questão.

Mesmo que Richard Osman venha do humor televisivo inglês existe aqui um modo específico de lidar com a terceira idade e as suas permanentes características ou condicionantes físicas, mentais, neurológicas. A jovialidade que ele dá a este grupo amador de investigação criminal vem precisamente de os colocar sob a batuta do “humor-gag”, por vezes sem sentido aparente, que nós temos o hábito de associar ao referido “humor-britânico” – Ron, um ex-aguerrido-sindicalista que lutara pelas condições do trabalho operário, pai do ex-pugilista Jason; Ibrahim que fora psiquiatra de renome; Elizabeth ex-investigadora policial, casada com Stephen, um velho ausente, exímio jogador de xadrez, Elizabeth que tinha sido colega e camarada de Penny (agora em coma, agora sua confidente passiva), esta última casada com o paciente enamorado John. Por fim, Joyce, ex-enfermeira e viúva de Gerry, mãe da arredia filha, a contabilista Joanna. Joyce que apoia emocionalmente Bernard, viúvo de Asima, guardião de um banco de jardim.

O livro é escrito em pequenos capítulos numerados e com narrativa alternada. Uma terça parte está identificada com o nome de Joyce pois são excertos do respectivo diário. A segunda parte é dirigida pelo vaivém das deambulações de Elizabeth, asinha na sua perspicaz correria, enquanto o último terço descreve o trabalho da investigadora Donna De Freitas que trabalha na polícia sob as ordens do inspector-chefe Chris Hudson, dedicado trabalhador, mais dedicado do que gostaria pois fá-lo também para esconder uma determinada frustração afectiva, familiar e até física. Aqui, na descrição de um homem solitário, depressivo e desmazelado, sugere-se a resposta para a segunda questão colocada lá atrás. Sim, Richard Osman concilia a estrutura emocional do investigador policial americano, pos-Marlowe, condensando-o na figura de Chris Hudson, pondo-o, no entanto, em confronto com as figuras dos quatro velhos amigos mais velhos, que lembrarão a divertida sobriedade aristocrática de Marple ou a empatia socio-psicológica de Maigret.

Pelo meio, existe um, dois, três, quatro, talvez cinco mortos espalhados e mais alguns supostos assassinos que poderão escapar por entre as malhas judiciais da sorte oficial ou, por outro lado, serem apanhados (e desculpados) pelo mais criativo grupo privado de investigação criminal. Todos instalados no centro residencial para velhos em Kent, Coopers Chase, instalado em cinco hectares de terreno arborizado com direito a antigo convento, igreja e a cemitério.

Naturalmente, devemos esquecer todas as extraordinárias coincidências (talvez demasiadas) que se encontram em cinco hectares e arredores ou no facto de todos, afinal, possuírem uma ligação mais ou menos forte com o evento, familiar ou geograficamente, Isso talvez pouco importe, pois Richard Osman tem um modo muito divertido de nos emocionar, até, talvez, a uma lágrima, ao transferir o carinho da escrita para todos aqueles seres que aguardam com paciência e alguma energia a chegada do luto. Aliás, o melhor do livro.

jef, julho 2025

 


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