quinta-feira, 31 de julho de 2025

Sobre o livro «Um Dia na Vida de Abed Salama – Anatomia de uma tragédia em Jerusalém» de Nathan Thrall, Zigurate, (2023). Tradução de Sara Veiga.



 







Quando chegamos ao final deste melodrama trágico, tão próximo do naturalismo pós-romântico, quase operático, de séculos atrás, temos uma nota do autor esclarecendo que a história que acabámos de ler é “um trabalho de não-ficção onde todos os nomes são reais excepto o nome próprio de três pessoas”. O autor é um jornalista americano de origem judaica a viver em Jerusalém, onde o drama se passou em 2012, num dia de chuva e numa estrada em mau estado de conservação que separa palestinianos e israelitas. As aldeias de Anata e Anatot estão isoladas pelo temor mas unidas pela distância de uma estrada breve.

O autor consegue transmitir os insolventes contornos históricos de um conflito com muros a crescer entre bairros segregados, postos de controlo, cartões coloridos e discriminatórios, colonatos a ocupar sistematicamente a terra de povos sem conciliação, obrigados ao nomadismo, num processo social próximo do tribalismo familiar ou de clã. A construção de colonatos, a chegada dos colonos, os acordos de Oslo, as duas intifadas, os bombistas suicidas…

O ponto de partida é Abed Salama, o pai de Milad de cinco anos que anseia por uma viagem a um parque infantil. Depois, ao longo dos capítulos, numa leitura imparável, conhecemos a ligação de todas as outras personagens que se vão cruzando de modo familiar, social, político, de resistência, e, por fim, que se unem através da dor implacável.

Um romance-relato comoventíssimo que nos esclarece o incompreensível drama eterno circunscrito a uma terra ancestral, dia prometida, dita santa, berço de uma certa civilização mais ocidental.

Um romance-relato imprescidível.


jef, julho 2025

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