terça-feira, 13 de julho de 2021

Sobre o filme «First Cow – A Primeira Vaca da América» de Kelly Reichardt, 2019























Kelly Reichardt é uma realizadora que cria objectos únicos, muito difíceis de esquecer. Oferece-nos uma espécie de imagem impressionista de uma América encantada-desencantada, bela, omnipresente, onde as personagens se movem entre a solidão e o aconchego, entre o olhar e a paisagem. No silêncio. Filmes que, todos eles, podiam ser mudos tal é a expressão emocional pela qual nos conta histórias incomuns de personagens muito comuns.

Quando vi «Wendy and Lucy» (2008) lembrei-me de «Sem Eira nem Beira» de Agnès Varda (1985). Logo que vi este, agora, recordei «Homem Morto» de Jim Jarmusch (1995).

Nunca mais deixei de associar Kelly Reichardt à brutal mas serena humanidade desses dois realizadores magnânimos.

«First Cow» tem uma epígrafe muito simples que resume poeticamente o filme inteiro. William Blake diz: «O pássaro constrói o ninho, a aranha a teia, o homem a amizade».

Cookie (John Magaro) é um cozinheiro sensível e atento que tem uma queda especial para os doces. King-Lu (Orion Lee) tem uma grande capacidade sonhadora para o negócio. Devem protecção recíproca por via da sobrevivência mas, acima de tudo, por simples amizade. Perdidos na fronteira do Oregon, vislumbram a chegada da primeira vaca com o primeiro leite, trazida para adoçar o chá do chefe de posto avançado fronteiriço (Toby Jones). E o negócio floresce.

O filme vem na sequência de outros belos filmes da realizadora «O Atalho» (2010) ou de «Certas Mulheres» (2016) mas traz este o ambiente afectuoso, simultaneamente triste e terno, dos tempos de crise no inóspito mundo dos bandeirantes americanos.

Um filme que se deve assistir com o tempo e com a pausa. Como se estivéssemos numa galeria silenciosa a admirar um quadro único.

 

jef, julho 2021

«First Cow – A Primeira Vaca da América» de Kelly Reichardt. Com Alia Shawkat, John Magaro, Orion Lee, Toby Jones, Gary Farmer, Scott Shepherd, James Lee Jones, Evie. Argumento: Kelly Reichardt e Jonathan Raymond, segundo o romance deste «The Half-Life». Fotografia: Christopher Blauvelt. Música: William Tyler. Produção: Neil Kopp. EUA, 2019, Cores, 122 min.

 

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