terça-feira, 21 de junho de 2022

Sobre o filme «A Marquesa d'O» de Éric Rohmer, 1976
































Falado pausadamente em alemão, para dar tempo ao teatro e à consciência e assunção da verdade por parte do espectador, o filme torna-se como um trunfo de entre tantos filmes de Éric Rohmer. Também se desvenda como a excepção que afirma a regra literária e a verve filosófica que preenche todos os poros da filmografia do realizador.

Nada melhor que apresentar o livro de Heinrich von Kleist não do modo do dialogante campo-contracampo, mas como surge na dramaturgia clássica, colocado num só plano, habitual também nas pinturas renascentistas ou nos quadros dos burgueses flamengos.

A Marquesa d’O (Edith Clever) vê-se a cargo com a dúvida de uma gravidez apócrifa e virginal após uma tentativa de violação por parte de soldados russos, quando da invasão do território integrado na Lombardia, e do seu salvamento pelo Conde F. (Bruno Ganz).

A verdade parece estar em dúvida, e o seu julgamento é, cerimoniosamente, assumido pelos diversos personagens que circulam em torno da virgem-grávida. Todos aqui respeitam a palavra do outro, a sua própria dúvida e o valor do arrependimento e do perdão como prova maior da humanidade.

Eles entendem, no entanto, que a verdade será sempre ratificada pelo amor. E será este a mais sólida garantia da sua contra-prova. Por isso mesmo, e apesar da sociedade, a Marquesa d’O publica um anúncio no jornal solicitando a irremediável presença paterna do seu futuro filho.

Um filme onde a ternura vale muito mais que a paixão, e a verdade brilha perante o julgamento alheio.


jef, junho 2022

«A Marquesa d'O» (Die Marquise von O) de Éric Rohmer. Com Edith Clever , Bruno Ganz , Edda Seippel, Peter Lühr, Otto Sander, Eduard Linkers, Ruth Drexel, Bernhard Frey, Hesso Huber, Erich Schachinger, Richard Rogner, Thomas Straus, Volker Prechtel, Marion Müller, Heidi Möller, Franz Pikola, Theo de Maal, Petra Meier, Manuela Mayer. Argumento: Éric Rohmer a partir do romance de Heinrich von Kleist. Produção: Klaus Hellwig e Barbet Schroeder. Fotografia: Néstor Almendros. Guarda-roupa: Moidele Bickel. França / Alemanha, 1976, Cores, 102 min.

               

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