quarta-feira, 29 de junho de 2022

Sobre o livro «Cadernos da Água» de João Reis, Quetzal, 2022










Este romance é como aqueles livros de anti-aventuras, o «1984» de George Orwell (1949) ou o «Fahrenheit 451» de Ray Bradbury (1953). O leitor fica perante (ou por dentro) de uma realidade que parece ficcionada ou de uma ficção que cheira a uma fantasia real e expectante.

Existe um incómodo que ameaça acelerar à medida que as páginas vão sendo viradas. E acelera mesmo, entre a angústia da espera e a solidão dos refugiados. Como num belo livro policial com ladrões e carniceiros.

Na Suécia, seguimos Sara e a sua filha Mariana, por um lado. Por outro, Emanuel, o marido e pai, que ficou para trás, numa terra poeirenta e desértica, assombrada por melícias compostas por torcionários armados. Na Península Ibérica, Portugal e Espanha deixaram as nacionalidades por terra. Quem ali nasceu ficou apátrida. Os governos fantoches protegem-se dentro de bunkers onda a comida e, principalmente a água, são racionadas.

Já ninguém fala da crise petrolífera. A guerra é feita pela conquista de um pouco mais de água. Os nórdicos montam campos de refugiados, ou de acolhimento, por eufemismo, para receber os fugitivos do Sul. A Rússia invadiu a Ucrânia e a China está a um passo de Taiwan. As convulsões sociais internas ocorreram em praticamente todos os países após o chamado Primeiro Evento e as Guerras Meridionais da Água. A bacia mediterrânica é o centro da catástrofe.

O mundo desaba enquanto os refugiados contam cada vez menos aviões que transportam sobreviventes para os locais ligeiramente mais seguros. O presente apenas aguarda, o futuro não é garantia.

Este livro tem uma missão ecológica de alerta mas não deixa de ser um romance escrito ao sabor lógico e perfeccionista da bela escrita do autor. João Reis é um escritor empenhado na boa literatura (e nas melhores traduções), também nas causas que transcendem a humanidade. Cada livro seu é uma brilhante novidade e uma descoberta para o leitor entusiasmado.


jef, junho 2022

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