segunda-feira, 27 de junho de 2022

Sobre o filme «Um Outro Mundo» de Stéphane Brizé», 2020.



















Ao contrário de «O Bom Patrão» de Fernando León de Aranoa (2021) este filme não é uma comédia. Antes uma tragédia sobre o mesmo desaforo do capitalismo contemporâneo. Bruto, lucrativo, insensível. O realizador Stéphane Brizé, depois de nos dar «A Lei do Mercado» (2015), lança-nos agora numa lição angustiante sobre “a lei do lucro” vista não pelo lado dos trabalhadores, como era o filme de 2015, mas pelo dos “sub-chefes executivos” das unidades fabris que têm a tarefa difícil de mentir aos operários e quase mentir aos patrões superiores, vagamente afastados no éter do espaço. Para a concentrações das mais-valias, há que reestruturar, reduzir custos na produção, realizar despedimentos a todo o custo, aumentar a carga laboral por operário.

Philippe Lemesle (Vincent Lindon) concentra o ódio dos trabalhadores e quando propõe reduzir os lucros suplementares distribuídos anualmente aos directores passa também a concentrar o ódio dos seus superiores. Pelo meio fica uma família destruída. A mulher, Anne (Sandrine Kiberlain) que força o divórcio e o filho, Lucas (Anthony Bajon) que expõe a sua raiva incontida entre a violência e o autismo. Nada mais simples. Nada mais dramático.

Tal como em «A Lei do Mercado», Stéphane Brizé coloca a tónica na crescente desestruturação interior da personagem de Vincent Lindon que, magistralmente, arrasta-nos através da sua crescente angústia. Também magistrais são os contrapontos familiares de Sandrine Kiberlain e Anthony Bajon. Outra peça fundamental é a frieza profissional e leviana da directora parisiense Claire Bonnet-Guérin, interpetada pela não menos magistral Marie Drucker.

Um filme moral e muito importante nos dias que correm para quem goste de apreciar o teatro no cinema.

Ou como bem explicar a lei básica do capitalismo em 97 minutos.


jef, junho 2022

«Um Outro Mundo» (Un Autre Monde) de Stéphane Brizé. Com Vincent Lindon, Sandrine Kiberlain, Anthony Bajon, Marie Drucker, Guillaume Draux, Olivier Lemaire, Christophe Rossignon, Sarah Laurent, Joyce Bibring, Olivier Beaudet, Jean-Pierre Gauthier, Didier Bille, Valérie Lamond, Mehdi Bouzaïda, Myriam Larguèche. Argumento: Stéphane Brizé, Olivier Gorce. Produção: Philip Boëffard, Stéphane Brizé, Pierre Guyard, Vincent Lindon, Christophe Rossignon. Fotografia: Eric Dumont. Música: Camille Rocailleux. França, 2020, Cores, 97 min.

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