terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Sobre o filme «O Fim do Outono» de Yasujiro Ozu, 1960


















A íntima distância da família.
Ninguém, como Ozu, filma essa fina película insolvente feita de amor, silêncio, cerimónia e mal-entendidos. Desconheço se os cinéfilos inventaram algum termo especial para classificar tal técnica cinematográfica. «Campo-contra-campo-a-favor-do-campo»? Todas as personagens são colocadas em paralelo, em planos desfasados, como se um papel vegetal estivesse sobreposto à imagem e Ozu se dedicasse minuciosamente a copiá-la, alterando-a. Todas as frases nos diálogos são compassadas, possuem uma fracção ínfima de silêncio entre elas. Ajuda a repensar cada palavra, a sopesar cada olhar, provoca-lhes um ligeiro atraso na acção mas amplia-lhes a importância, a objectividade. Mesmo muitos dos títulos dos seus filmes reflectem essa demora consciente: o Outono vai terminar, a Primavera é tardia. As novas gerações amam mas impacientam-se, as gerações anteriores aceitam esse amor mas escudam-se na memória. A música é ternamente alegre antes do drama, soa em tons menores antes do humor. A Grande Guerra está lá, o passado omitido, também a Grande América, o presente imposto. Tudo em simultâneo, mas com desfasamento… Afinal, a vida é mais simples do que nós sentimos, mas para a compreendermos é preciso atrasar (ou adiantar) o relógio. Ozu ajuda-nos a interpretar esse lapso familiar tal como, anacronicamente, ele nos é devolvido pelo Tempo.
A melhor definição para Nostalgia.

jef, agosto 2014

«O Fim do Outono» (Akibyori) de Yasujiro Ozu. Com Setsuko Hara, Yoko Tsukasa, Mariko Okada, Keiji Sata, Shin Saburi, Sadako Sawamura, Miyuki Kuwano, Chishu Ryu, Ryuji Kita. Música: Kojun Saito. Japão, 1969, Cores, 128 min.

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