quarta-feira, 27 de junho de 2018

Sobre o livro «Veracruz» de Olivier Rolin. Sextante, 2017














Olivier Rolin é um escritor que dificilmente se liberta da vocação de viajante, de solitário, de literato. Ele constrói-nos o mundo através desse romantismo extremo do fim da viagem que é o desejo de regressar a casa. E partir de novo. Em Rolin, os livros são o garante do retorno, quantas vezes também de um abandono triste, tão distante do dia de partida. Acima de tudo, já tão diferente.

Mas a novela «Veracruz» aproxima-se de um outro romantismo, o do amor concreto, certamente vital, certamente funesto porque fugaz. De certo modo, invulgar no trabalho do escritor francês.

1990, Veracruz, México. O bar «El Ideal» a lembrar o «Tropicana» de Havana e «Nighthawks» de Hopper. O ciclo de conferências «Proust irrita-me». Na primeira das 90 páginas parece que vamos correr atrás daquele frenesim estático à Vila-Matas. Mas não.

Avizinha-se uma tempestade e, numa sala de certa casa senhorial, em silêncio, Inácio, Miller, El Griego e Susana, medem rigorosamente os movimentos uns dos outros enquanto organizam o contrabando de charutos desfazendo a velha biblioteca. Odeiam-se ou amam-se ou já se amaram. «Se as minhas pálpebras lábios fossem» Inácio lembra os sonetos de Francisco de Quevedo. O século de ouro. Uma noite de tormenta.

A narrativa chega anónima às suas mãos e ele aguarda desesperado e bêbado a entrada da voluptuosa liberdade de Dariana. Pouco mais ele saberá dela após a partida instantânea. A cronologia investigada parece ser anacrónica. A tempestade não condiz. Dariana também não.

Muito mais nós ficamos a saber desse amor inconcluso. Olivier Rolin deixa-nos suspensos e a leitura renovada de velhos textos contém a parábola (ou paranóia) inconstante da diferença. Um erro na tradução pode conter a explicação de um eterno amor findo.

jef, junho 2018

2 comentários:

  1. Viva JEF,
    também gostei bastante deste livro, e já estava rendido ao autor depois do fabuloso "o meteorologista", este verdadeiramente na fronteira entre o romancista e o viajante.
    abraço
    Miguel Henriques

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  2. Olá Miguel! Lê também «O Caçador de Leões» ou «Baku». Tem uma crítica aqui no blogue sobre o «Meteorologista». Abraço jef

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