quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

Sobre o filme «Dogman» de Matteo Garrone, 2018
















Um ventoso e húmido descampado com um pequeno parque infantil no centro, rodeado de um casario, triste e térreo, que poderia sair de um western, «Quem Matou Liberty Valance» (John Ford, 1962). Estamos perto de uma praia romana semelhante às imagens que surgem em «Querido Diário» (Nanni Moretti, 1993) quando nos aproximamos do local onde Pier Paolo Pasolini foi assassinado. São estas imagens exteriores, palco de uma comédia sangrenta que tende para uma tragédia ‘verdiana’ onde a bondade extrema, quase canina, se vai confundindo numa sucessão violenta de mal-entendidos e traição pura.

Os cenários interiores são belos e degradados mas nem tempo temos de lhe dar a atenção devida, como no claustrofóbico «Cães Danados» (Quentin Tarantino, 1992). O hotel para cães do amoroso Marcello (Marcello Fonte) vive paredes meias com uma casa de compra e venda de ouro e com um amigo violento e néscio, viciado em cocaína, de nome Simone (Edoardo Pesce). Marcello deseja dar férias de sonho a sua filha mas o dinheiro não chega. Para isso, trafica droga. Marcello ama-a e ama os cães. Mas nem assim Marcello deixará de ser atraiçoado pela lealdade e pela vingança.

A luz, a cor, os planos, os retratos, são quase renascentistas.

Todo o filme segue o corpo e a expressão dramáticas do actor Marcello Fonte. Também Marcello Fonte é todo o filme e recebe a palma de ouro em Cannes. Os cães recebem o DogPalm, e merecem. Sem a sua presença, sublinhando, por comparação-contradição, esse benévolo e crente princípio da humanidade, a vocação de anjo caído de Marcello não faria sentido.

jef, janeiro 2019
                                                               
«Dogman» de Matteo Garrone. Com Marcello Fonte, Edoardo Pesce, Nunzia Schiano, Alida Baldari Calabria, Adamo Dionisi, Aniello Arena, Francesco Acquaroli, Gianluca Gobbi, Giancarlo Porcacchina, Laura Pizzirani. França / Itália, 2018, Cores, 103 min.

Sem comentários:

Enviar um comentário