domingo, 10 de agosto de 2025

Sobre o livro «Campo Pequeno» de João Pedro Vala, Quetzal / Língua Comum, 2024



 







Este é um livro inútil, talvez mesmo desnecessário, porque profundamente moralista. Talvez presunção.

Peço desculpa. Eu não gosto nada de dizer mal de uma obra, primeiro, porque dá muito trabalho a escrever, a rever, a editar e, no final, os leitores-compradores sempre escasseiam. Segundo, porque o meu tempo é limitado e tenho uma pilha de clássicos a exigir a minha atenção.

Acontece estar eu a viver num mundo de uma violência atroz, sem sentido, abjecta, quase abstracta para o modo em que fui educado e em que pretenderia continuar a existir. Por isso, quando me surge um livro onde um super-narrador que convive com os personagens (mas por pudor não se dá a conhecer), por achar que todos os seus amigos: a Laura, o Heitor, o Gabriel, a Mafalda, o Hugo, as respectivas famílias, e todos os outros que vão aparecendo sem sentido narrativo (desculpando-se o narrador,  porque apenas assim, lhe apeteceu…), todos os personagens, repito, são na prespectiva do narrador violentamente irresponsáveis, não assumidos, mal resolvidos, gostam de apanhar pancada, talvez por incompreensão ou apenas por serem néscios ou mesmo burros. Salve-se o pequeno Tomé que por ser bebé talvez ainda não se tenha apercebido que nasceu com o pecado original no coração…

(Aliás, fiquei com a mesma sensação de inutilidade da violência, o que me deixa a pensar que tal sempre revela uma hiper-moralidade por parte do criador, quando vi o filme «Parasitas» (Bong Joon Ho, 2019). Tanta violência e má disposição sem sentido, apenas as consigo admitir infelizmente na realidade. A arte tem outro sentido, acho, para mim. Sobre o assunto, e sem pensar muito, lembro-me de obras contrárias como «Crime e Castigo» (Fiódor Dostoiévski, 1866), «Estilhaços» (Bret Easton Ellis, 2021), «Assim para Nós Haja Perdão» (A.M. Homes, 2012) ou, mais recentemente, o filme «Sirât» (Oliver Laxe, 2025), nos quais a violência e o incómodo surgem como pathos narrativo para nos levar apenas a uma conclusão – se assim o desejarmos – no nosso mais profundo sentimento.

Por outro lado, o autor enche-se de brio e convoca alternadamente para a sua escrita tiradas jocosas sobre personagens populares (que saudades de «O Que Diz Molero», Dinis Machado 1977) e rajadas filosóficas à Ortega y Gasset sobre a estúpida inconsequência de cada uma daquelas personagens.

(E já agora, o que faz ali no meio, a morte de uma freira ocasional, a aparição de um Genghis Khan que se besunta de perdiz pútrida antes de ir para a caça, de um qualquer jogador de futebol de nome Toninho Mamas, de um encontro libidinoso numa carpintaria entre César e Delfim?)

Enfim, desejo sinceramente longa vida, alegre e com saúde, para o autor, João Pedro Vala, e vou avançar para um próximo livro.


jef, agosto 2025

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