Dizem que não há muitos temas para a literatura. A Morte e a
Guerra, seguramente. A Solidão, se quisermos acertar em 99% da crítica.
Pouco mais.
Enfim, depois temos «A Cidade e as Serras»...
Irreverentemente luminoso mas publicado no início do século passado, após a
morte do autor.
«O Deserto dos Tártaros» tem o condão de colocar a Morte, a
Guerra e a Solidão em pé de igualdade e no interior do labirinto do tempo,
condensando a humanidade num átomo apenas:
“O que fizemos com o tempo que nos foi já concedido, o que
faremos com o restante, sabendo que o que ficou para trás vai sempre aumentando
e o que virá será sempre mais curto?”
E tendo a certeza de que a linha do tempo não é rectilínea,
nem sequer curva, é mesmo labiríntica.
O jovem tenente Giovanni Drogo sai de casa da família quando
é colocado, numa manhã de Setembro, na Fortaleza Bastiani. Decrépita
fortificação castrense esquecida entre a vida influente da cidade e o deserto
dos tártaros. Será apenas mais um dia da sua juventude a ser vivido.
Mas a Fortaleza Bastiani é um labirinto estranho, digamos «Escheriano»,
onde o velho passado vive apaixonado pelo futuro, mas onde muito pouco acontece.
Apenas as circunstâncias condicionantes e as escolhas duvidosas podem indicar a
saída e a alteração de um «destino».
Este é um livro sobre a capacidade de decidir
face ao correr do tempo, de segurar o que não é tangível, de conquistar o
imprescindível, de nos aproximarmos da metafísica.
«O Deserto dos Tártaros» é, acima de tudo, um livro sobre a Liberdade. Sobre essa faculdade, quantas vezes existencial, de que Mário de
Carvalho nos fala num dos mais assombrosos contos da literatura universal. «A Liberdade
de Pátio».
Nota: num livro desta dimensão temporal, geográfica e
arquitectónica, a revisão deveria ter sido mais aturada e a tradução mais
ponderada.
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