Elogio a Gisela João.
Será difícil que, com
este disco, alguém que não goste de fado passe a gostar. Mais fácil será prever
que o primeiro disco da fadista ditará mais algumas achas na grata discussão
sobre a renovação, a origem e as consequências do fado e dos novos fadistas. Alguns
medirão a cantora e tentarão colocá-la na escala absoluta de Richter, onde se
perfilam, santificados, Alfredo Marceneiro, Amália, Beatriz da
Conceição, Maria Teresa de Noronha, Carlos Paredes ou Carlos do Carmo (e onde
aguardam beatificação Aldina Duarte, Manuela de Freitas ou Camané). Todos sabem
que o fado nunca será ciência, será outra coisa muito pouco definida e que se
deseja sempre diferente para podermos dizer que é sempre igual, como diria o
príncipe de Lampeduza.
A cantora sabe (sente) bem do facto e a primeira coisa
que me surge ao ouvi-la é algo que se diz de Amália: «Ela até canta o fado!».
Gisela João, numa fúria emotiva, ataca sem tréguas ou panaceias orquestrais, os
fados tristes e menores, os alegres e maiores, os ‘renovados’ com letra de Ary
dos Santos, os viras e malhões, o ‘não venhas tarde’, o ‘maldição’ ou a ´casa
remax da mariquinhas’. De certo modo, o contralto quebrado da voz, a guitarra
portuguesa de Ricardo Parreira e a viola de fado de Tiago Oliveira, piscam o
olho (o ouvido) à essência da canção e cobrem-na de uma forte irreverência,
agressiva, diria ‘punk’. Por mim, folgo em emocionar-me com um disco sobre o
qual deram grande destaque na imprensa e ofereceram enorme expectativa.
O fado
é mesmo assim, tem de ser popular, tem de ser, de certo modo, emocionalmente
erudito.
Serve ainda o presente
para elogiar, igualmente, o grande fadista e produtor executivo do disco,
Hélder Moutinho. A produção e direcção musical: Frederico Pereira.
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