Já tínhamos compreendido com
Pedro Costa («Onde Jaz o Teu Sorriso?» 2001), este através de Danièle Huillet e
Jean-Marie Straub («Sicilia!» 1999), que a beleza está, justamente, nesse
fotograma perdido que revela (ou esconde) o trejeito de um sorriso. Parece-me que
essa capacidade estética de sublinhar ou desvanecer a sombra de uma imagem é o
verdadeiro sinal contido na arte maior. Expor a intimidade como arte (pública)
sem que seja revelada, sem haver devassa, fazendo antes do espectador cúmplice
e devedor de uma ideia, é ética que nem todos os realizadores se podem gabar. Tal como Pedro Costa, mestre superior nessa demanda («No Quarto da Vanda» 2000),
Abdellatif Kechiche consegue filmar uma refeição familiar sem a exibir (e o que
há de mais íntimo que um cuscuz de peixe partilhado por amigos em tarde de fim-de-semana?
- «O Segredo de um Cuscuz» 2007). Filmar um sorriso, uma lágrima, um jantar de
esparguete à bolonhesa, a sesta sonolenta de uma criança ou uma relação sexual,
tornando o público “protector” desse fotograma encoberto, é coisa rara, coisa difícil
para actores e para quem tem a câmara em acção. Também para quem o idealiza e lhe
realiza a montagem. Abdellatif Kechiche é absolutamente rigoroso na escolha ética
do fotograma a esconder. Também as actrizes Adèle Exarchopoulos e Léa Seydoux
são absolutamente intransigentes na assunção da partilha dessa beleza oculta.
jef, dezembro 2013
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