Este é um romance desabrido. Sem paninhos quentes ou
rodriguinhos que facilitem a vida ao leitor. Uma espécie de livro policial ou
de suspense ou thriller que fica suspenso
entre a realidade e a vocação literária de alterar a realidade para melhor a
fixar, melhor, para a alterar e assim ficar mais compreensível, mais dura, ou
mais ficcional.
Califórnia, Los Angeles, colégio Buckley, 1981. O finalista
Bret Ellis tem 17 anos e anda a escrever o seu primeiro romance «Menos que Zero». Ele e os
colegas vivem em grupo, numa "bolha", a amizade protege-os no conforto da abundância e na
independência e distanciamento familiares. O dinheiro, o sexo e as drogas não
parecem ser problema no interior do luxo e da luminosidade de Los Angeles. As
cassetes com as novidades discográficas e os teatros exibindo no grande ecrã os
êxitos cinematográficos fazem de banda sonora e banda visual para o dia a dia
daqueles adolescentes que ainda não estão preparados para enfrentar a visão
adulta do mundo ou perder a alheada inocência que teimam em praticar. De «Shining»
de Stanley Kubrick (1980) a «Icehouse» (1981). Apenas a homossexualidade vai
ficando, oculta mas usufruída, suspensa na moldura do quadro do privilégio de
uma sociedade. Até que, no último ano de liceu, é transferido um novo aluno,
misterioso e atraente, no mesmo momento em que dá alvíssaras a actividade
criminosa de um grupo que se aproxima, rondando, com uma série tenebrosa de
assassinatos.
Em «Estilhaços» não existe contemplações com as narrativas
sobre o sexo, as drogas e os cadáveres doa animais, ou com as descrições pormenorizadas das cores, das
roupas, dos ambientes, das mansões e piscinas particulares, da geografia da
costa californiana. Também do horror. Verdade ou simulacro literário?
Um quase diário sobre a especulação artística numa atmosfera
que talvez já tenhamos vislumbrado com os livros de Raymond Chandler. Ou com «Mulholland
Drive» (David Lynch, 2021) ou «Era Uma Vez Em... Hollywood» (Quentin Tarantino,
2019). Só que neste "filme" existe uma nova definição para a literatura de
entretenimento e horror.
Silêncio e Mentira e Torpor e Medo são os substantivos que suportam
esta narrativa imparável com uma estrutura exegética construída em finíssima
minúcia.
Quem não se sentir tocado por estes substantivos adjectivados
e continuar a dormir descansado depois da leitura de «Estilhaços» de Bret
Easton Ellis já terá vendido o coração ao diabo.
jef, novembro 2024
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