«A
Aventura» condensa todo o dicionário do olhar em Antonioni. Vemos este filme
como se estivemos a ler Roland Barthes ou John Berger e a identificar a imagem que,
a cada olhar (cada silêncio ou cada badalada de um sino), nos atrai e nos faz
progredir emocionalmente na história.
E
nesta, todos os personagens estão confinados numa ilha, num certo encantamento
ou desespero. Todos aguardam, todos procuram, todos tentam encontrar um
esconderijo, fugir. Mas ninguém parece encontrar alguém ou encontrar-se a si
mesmo. Apenas Anna (Lea Massari), a fugitiva, é eficaz! Sandro (Gabriele
Ferzetti) foge do passado de arquitecto frustrado e Claudia (Monica Vitti) da
velha amizade com Anna, que a persegue como um espectro funesto tal como o
olhar ávido das dezenas de homens sicilianos que a envolvem. Sandro e Claudia
tentam amar-se ou amam-se verdadeiramente? No final, a mão sobre o ombro e as
lágrimas não são totalmente elucidativas. Apenas estão contidas numa das cenas
mais comoventes realizadas por Antonioni. Afinal, todos continuam sitiados e
uma ilha é um espaço mais do que dramático, inexorável.
Tão importante na vida é o medo como o perigo, a luz como a arquitectura.
Mais
forte que a presença, é a ausência.
Mais
importante que a procura, é a fuga.
Mais
forte que o amor, é o perdão.
Mais
importante que a palavra dita ou escutada, é a imagem que fica cativa no olhar.
Assim dita a lei da beleza e da semiótica de Antonioni!
jef, agosto 2021
«A
Aventura» (L’Avventura) de Michelangelo Antonioni. Com Monica Vitti, Gabriele
Ferzetti, Lea Massari, Dominique Blanchar, Renzo Ricci, James Addams, Dorothy
De Poliolo, Lelio Luttazzi, Giovanni Petrucci, Esmeralda Ruspoli, Enrico
Bologna, Franco Cimino, Giovanni Danesi. Argumento: Michelangelo
Antonioni, Elio Bartolini e Tonino Guerra. Produção: Amato Pennasilico. Fotografia:
Aldo Scavarda. Música: Giovanni Fusco. Guarda-roupa: Adriana Berselli. Itália /
França, 1960, P/B, 132 min.