Diz a contracapa:
«Escrita
no Norte de Moçambique, em plena guerra colonial, é a primeira ficção de um
escritor português que depois veio abordar outros temas em vários trabalhos
literários. Tentando iludir a realidade violenta em que se encontrava,
dedicou-se a recriar e a mostrar um certo submundo de Lisboa.»
É
verdade. A Regra do Jogo Edições tinha um plano editorial fora do comum,
libertador e refractário. Por lá se lêem Dashiell Hammett, Joe Gores, Vernon Sullivan
/ Boris Vian, Isabel do Carmo e Fernanda Fráguas, Nuno Júdice, Alberto Pimenta
e Artur Cortez.
Afinal,
ele é António Modesto Navarro, nascido em Vila Flor, em 1947, político,
activista cultural, escritor e fundador da Associação Portuguesa de Escritores.
Escreve «Morte no Tejo» em Moçambique (1966) para enganar a guerra e a fome de
paz e liberdade. Este seu primeiro romance esperou 16 anos para poder ser lido
em letra de imprensa.
É
um scherzo, uma brincadeira à Raymond
Chandler / Philip Marlowe numa corrida sem pausas por toda a noite de Lisboa,
saltando de episódio em episódio, de bar em bar, de cena para cena de
pancadaria feroz, onde o detective privado e pugilista frustrado “Diplo” (de
Diplomata) dá muito, leva menos e sai sempre fresco, talvez apenas com um ligeiro
ferimento provocado por certa bala de raspão. Guia depressa o MG, dorme
pouquíssimo, tem lâminas no tacão do sapato, caramelos soporíferos na
algibeira, bebe muito rum e deseja os braços e o colo de Linda, o protótipo de
noiva, ou os de Laura, a cantora romântica, ou os de Mariana, a empresária de bebidas
espirituosas que o contrata para afugentar a concorrência na candonga.
Da
Ajuda ao Cais do Sodré, a Sintra, à Costa da Caparica, passando pela Espelunca,
pelo Martingala, pelo Beira Gare, pelo Dingo, pelo Estádio do Benfica (para ver
o Sporting perder!). «Morte no Tejo» é como um mapa emocional de Lisboa
antiquado à custa da devoção da memória e romantizado pela distância de um África
em pé de guerra.
Diz,
por fim, o «À Maneira de Posfácio» de Manuel Gusmão:
«A
surpresa de um policial português vem logo disto: do modo como as regras de
género, os procedimentos, os “truques” do “policial negro” funcionam sem
sobressalto ao serem transpostos para nomes portugueses, para falas e lugares
reconhecíveis, de Lisboa. Assim, encontramos a eficácia narrativa, a agilidade
verbal, não só no modo de contar as acções, mas no modo como as personagens,
particularmente “Diplo”, “falam”.
jef,
agosto 2021
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