quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Sobre o disco «Recanto» de Gal Costa, Universal, 2011















Existe uma preciosidade específica no disco que toca fundo e ao mesmo tempo nos transcende. Toca-nos porque nos complementa ou completa. «Recanto» é um acto de amor físico, afectuoso, moral e político, tropicalista, entregue a Gal Costa por Caetano Veloso (que escreve e compõe todas as canções). Também de Moreno Veloso, seu afilhado, que produz o álbum. Também do músico Kassin que electriza, electronicamente e electricamente, quase todas as 11 faixas.

Nos complementa ou completa porque é um disco centrado na palavra dita, mesmo que cantada, como fazem os grandes poemas que trazem a própria música dentro e nos fazem crer que somos também parte deles.

Transcendem-nos porque o que não entendemos é o que mais gostamos. A grande música brasileira tem sempre qualquer coisa que se auto-transgride.

Uma libertação dos cânones e, ao mesmo tempo, um amor profundo pelo que os cânones ajudam a manter vivo, na memória e na usurpação desta.

O limite poético entre a palavra vocalizada e a palavra recitada pela palavra, entre a bossa-nova e o baião, a canção de embalar, a electrónica, a guitarra eléctrica, o hip-hop e o sample arranhando o vinil.

Não esperem samba! Não esperem alegria louca! Aguardem a consciência simples que se inicia:

«Eu venho de um recanto escuro
O sol, luz perpendicular
Do outro lado azul do muro
Não vou saltar»

E temina:

«Esse é a última cerveja
Bendigo quem vai à igreja
Quem não vai, louvado seja
Segunda é dia de branco.»

jef, fevereiro 2019

terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Sobre o filme «A Cidade Branca» de Alain Tanner, 1982




Terei visto o filme em 1983. E com alguma cautela pelo tempo que passa pelos filmes e por nós, voltei a vê-lo ontem numa cópia em película 35mm riscada a sublinhar a beleza da fotografia de Acácio de Almeida. 36 anos passaram, Lisboa mudou, e envelheceu do ponto de vista turístico, Bruno Ganz desapareceu.

Mas o filme continua a fazer sentido nesse modo poeticamente bruto de colocar o marinheiro suíço Paul (Bruno Ganz), desembarcado em encalorada Lisboa, a apaixonar-se por uma rapariguinha empregada de balcão e criada de quarto com apenas um ordenado (Teresa Madruga).  Os longos lençóis brancos pendurados continuam ao som da música de Jean-Luc Barbier. As galinhas có-có saltam ainda nos degraus de Alfama. O eléctrico 28 permanece. A quase morte diluída na abstracção das pedras das calçadas e nas águas do Tejo. Bruno Ganz reflecte a luz e mostra como é o actor da sinceridade dramática, do espelho emocional que transforma Paul numa espécie de ermita urbano sorridente, navegando entre a paixão e o esquecimento. Teresa Madruga dá-nos o lado absoluto da juventude e da vocação pela procura sem destino à vista. Olhando e vendo o filme não é necessário ir ao dicionário para conhecer o que significa os seus pontos cardeais: a espera, a liberdade, a solidão e a ausência.

jef, fevereiro 2019


«A Cidade Branca» (Dans la Ville Blanche) de Alain Tanner. Com Bruno Ganz, Teresa Madruga, Julia Vonderlinn, Joana Vicente, Lídia Franco, Pedro Efe, José Wallenstein, Francisco Baião, Cecília Guimarães, José Carvalho. Fotografia: Acácio de Almeida. Produção: Filmograph SA, Metro Filmes. Música: Jean-Luc Barbier. Suiça / Portugal, 1983, Cores, 108 min.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Sobre o filme «A Favorita» de Yorgos Lanthimos, 2018



















Nestas coisas de ‘filmes de época’, vai-me ficando o vício de ir à net em busca de qualquer coisa, apesar dos erros, das mentiras, das falsidades, que inundam tal éter... Wikipédia forever!

A saber. Parece que Anne teve um reinado curto de doze anos (1702-1714) mas foi uma mulher de armas, unindo a Escócia à Inglaterra, formando a primeira Grã-Bretanha. Foi uma rainha que fortaleceu o sistema parlamentar bi-partidário, entre os liberais ‘whigs’ e os conservadores ‘tories’. Pelo meio, as usuais contendas mais ou menos sangrentas com a França. Sim, consta que esteve 17 vezes grávida, nenhum dos filhos chegou à idade adulta, e tinha duas favoritas: Sarah Churchill, duquesa de Marlborough, e Abigail Masham, a baronesa Masham, que a ajudaram nas intrigas de quarto da ‘política democrática’.

Afinal, não consta que a rainha Anne (Olivia Colman) tivesse assim uma saúde tão débil, fosse lésbica, tomando-se de amores carnais, ora com Sarah Churchill (Rachel Weisz) ora com Abigail Masham (Emma Stone), mantivesse 17 coelhos no quarto e que fosse votada a luxuriosa e aguerrida vida no interior do seu sumptuoso palácio, revestido a belas madeiras e tapeçarias de encher o olho.

Contudo, existem fortes motivos para ver o filme. Acima de tudo, o facto de ser uma possível tragédia transformada numa ostensiva comédia, onde brilham os extraordinários fácies (em close-up) de actrizes maiores: Olivia Colman, Rachel Weisz e Emma Stone, colocando-as no centro de uma intriga política de limites bem palacianos, com dossel e tudo.

O realizador Yorgos Lanthimos toma em mãos tão cativante cenário, tão exagerado guarda-roupa, tão refinada banda sonora, tão estilizada iluminação, tão rico portfólio de pecados capitais e ainda lhe acrescenta um oitavo: não pára de filmar, ultrapassando a fronteira onde a decadência luxosa se transforma um pouco em exibição inútil. Por que razão usa a lente “olho de peixe” transformando todos os cenários em aquários convexos? Por que insiste na banda sonora repetida de dois tons, contrabaixo e percussão? Por que recorre sistematicamente à mesma escatologia para ‘enegrecer’ as cenas?

Se quisesse usar assim o guarda-roupa devia rever «My Fair Lady» (George Cukor, 1964).
Se quisesse usar o cenário e a escatologia podia dar uma espreitadela a «O Cozinheiro, o Ladrão, a sua Mulher e o Amante Dela» (Peter Greenaway, 1989).
Se desejasse usar a intriga da guerra e do palácio, da sedução e da mentira talvez devesse rever «Barry Lyndon» (Stanley Kubrick, 1977).

Apesar de tudo, um filme fora das guerras e das regras dos Óscares e de Hollywood. Também por isso vale a ida ao cinema.

jef, fevereiro 2019

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

Sobre o disco «Manga» de Mayra Andrade, Columbia / Sony, 2019











Mayra Andrade sempre me encantou no modo de criar um mundo muito puro, quase inocente, para não dizer ingénuo, em não ceder a estratégias mais ou menos folclóricas, recusando enveredar pelo fácil caminho da soul e do funk que agora invade toda a pop-simples com berros e revérberos ‘kuduro’ de trazer por casa e latinices ‘rickymartin’ para animar festas de despedida de solteiro.

Mayra Andrade tem na mão a super-produção musical mas recusa abdicar do seu lado suave de colocar letras em português e em crioulo no suave timbre da sua voz. Também não abdica em dar otom dançável do funaná mesmo que lhe misture a electrónica de ritmos e ecos de anos quase ancestrais. Também não recusa misturar-lhe o acústico das cordas nos mais simples poemas, nas mais simples melodias, de Sara Tavares ou Luisa Sobral.

É, acima de tudo, uma bela voz que interpreta poemas.

Temos ainda «Afeto», «Manga» ou «Vapor di Migrason» da própria Mayra com a mais moderna simplicidade dançante ou, a fechar, «Badia» (Nivaldo leite / Luis Gomes) e «Festa Sto Santiago» (Tibau Tavares), recuperando os limites musicais e aquáticos das ilhas mais amorosas do mundo.

«Manga» lembrará, por vezes, a liberdade contemporânea de Elida Almeida ou a pujança tradicional de Lucibela mas confirma que a sua autora tem a interpretação dos poemas na voz e o tónus vital cabo-verdiano na alma, no coração e nos pés! Música e morabeza!

jef, fevereiro 2019

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Sobre o disco «A Pele do Futuro» de Gal Costa, Biscoito Fino, 2018














«Vou seguir a minha vida
Não sou mais uma menina
Tenho que enfrentar o mal
Seja lá qual for
Me fortalecer na dor»
                            (Hyldon)

Em 1978, Gloria Gaynor cantava «I Will Survive».
Em 2018, Gal Costa vai à raiz da ‘dance music’ dos anos 70 e canta o poema de Hyldon. Resistência, passado consumado e futuro garantido.

«Livre do amor para amar, alforriada das canções melosas» escreve Adriana Calcanhoto.
«Cabelos e unhas, parece que, tenazes, ainda crescem depois que a gente não estiver» escreve Paulinho Moska.
«Sou libelo do perdão escrito pela mão sagrada do avatar que está em todo o lugar e a todo o tempo dentro de nós.» escreve Guilherme Arantes.
Gal Costa e Maria Bethânia cantam «Minha mãe me deu a vida e sempre ela me dará.»
Gilberto Gil diz: «A casca da ferida se formando, a cicatriz na pele do futuro. Não mais o esperma e o óvulo da morte.»

Gal Costa canta: «Sou filha de todas as vozes que vieram antes. Sou mãe de todas as vozes que virão depois.» (Nando Reis)

E ainda tem o início «Sublime»!! (Dani Black)

O Tempo! Quem quiser defender-se do Futuro, receber o Passado e resistir ao Presente, o melhor é limpar as lágrimas e ir dançar! Gal Costa tem 73 anos de idade, 53 de carreira e tem a razão absoluta. Ela explica tudo nestas 13 canções fabulosas.
Pupillo (direcção musical) e Marcus Preto (direcção artística), também!

jef, fevereiro 2019

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Sobre o filme «Mektoub, Meu Amor: Canto Primeiro» de Abdellatif Kechiche, 2017





















Abdellatif Kechiche provoca-nos o olhar. Olhamos porque, simplesmente, gostamos de olhar. Estamos nas praias de Sète, Sul de França, férias de Verão. Agosto 1994. Um grupo de primos e amigos reúne-se. Não há telemóveis. O realizador adapta livremente o romance «La Blessure La Vraie» de François Bégaudeau (que já tinha dado azo ao filme «A Turma» de Laurent Cantet, 2008).

Amin (Shaïn Boumedine) chega da cinzenta cidade de Paris para a luz do Mediterrâneo. Vai ter com Ophélie (Ophélie Bau) mas esta está com o seu primo Tony (Salim Kechiouche). Mais tarde, vai à praia e encontra duas amigas, Charlotte (Alexia Chardard) e Céline (Lou Luttiau). A mãe manda-o apanhar sol mas ele estuda cinema e prefere ver no escuro do quarto «Arsenal»  de Aleksandr Dovzhenko (1929). Assim o Verão continua com o tempo que a luz prefere alongar.

É nesse prolongar do tempo de exposição que está o segredo do filme. As cenas são estudadas ao pormenor ou, pelo menos, repetidas até conseguir a perfeição de uma ideia ou até que uma imagem surja indelével. Para isso é preciso dar tempo aos actores para que dêem tempo aos personagens para que entreguem o mesmo tempo ao espectador. Melhor, se entreguem ao olhar do espectador que, na sala de cinema, não é tanto indiscreto mas muito mais cúmplice o que, neste aspecto, é o seu contrário. Um olhar discreto e solidário.

A câmara é colocada muito perto dos actores, quase os toca, numa intimidade compassiva. Se namoram, se tomam banho, se almoçam na praia, se ordenham cabras ou dançam na discoteca. Abdellatif Kechiche nunca desdenhou a proximidade sobre a beleza dos corpos ou o distender do tempo contido numa refeição, numa corrida, numa conversa banal.

Abdellatif Kechiche deseja que o espectador faça parte do clã, sem juízo ou prejuízo. Só com o olhar, ao sabor da pele. Então façamos-lhe a vontade e olhemos de olhos bem abertos aguardando com tranquila ansiedade a próxima etapa. «Intermezzo», a continuação, chegará em breve. Sim, haverá tempo!

jef, fevereiro 2019


Kechiche, Abdellatif «Mektoub, Meu Amor: Canto Primeiro» (Mektoub, My Love: Canto Uno). Shaïn Boumedine, Ophélie Bau, Salim Kechiouche, Alexia Chardard, Lou Luttiau, Hafsia Herzi, Salim Kechiouche, Shaïn Boumedine, Hafsia Herzi, Kamel Saadi, Sieme Miladi, Estefania Argelich, Hatika Karaoui. Adaptação do romance «La Blessure La Vraie» de François Begaudeau. Itália / França / Tunísia, 2017, Cores, 181 min.


sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Sobre a exposição «Candido Portinari em Portugal» Museu do Neo-Realismo, Vila Franca de Xira, até 3 de Março de 2019




















A.
Quando o Pavilhão do Brasil na Exposição do Mundo Português, em 1940, recebeu a obra «Café» de Candido Portinari foi olhada por milhares de portugueses que iam passear e divertir-se à feira. Portinari pintava ou (ilustrava) o trabalho de quem trabalhava nos campos de café, usando essa técnica muito dele de misturar o realismo, o naturalismo, até essa forma quase cubista de ampliar de modo extravagante e bela os músculos dos trabalhadores povo, escondendo-lhes o olhar sob o peso da safra. «Café» foi considerada um verdadeiro cavalo de Tróia que entrava no coração do maior evento de propaganda do regime. Estava a Europa em guerra e parte da beira-rio de Lisboa havia sido arrasada para ali se edificar aquela exposição mundial.

B.
É com comovente ternura e excitação que, em 1946, Mário Dionísio recebe a notícia que Portinari, a caminho de Itália, deseja vir conhecer o pintor e escritor português. Mário Dionísio havia tomado conhecimento da existência do pintor brasileiro através das imagens impressas numa folha de jornal que, um dia de ventania invernosa, se lhe tinha vindo enrodilhar nas pernas. A amizade perdurou e o escritor português realizou um importante trabalho sobre Portinari, publicado 20 anos depois.

C.
Ferreira de Castro em 1955 escreve a Portinari para que ele ilustre uma edição de luxo comemorativa da edição do romance «A Selva». O pintor deixou para trás outras encomendas e lançou-se ao trabalho magnífico sobre a obra maior de Ferreira de Castro.

D.
Tudo isto está inscrito nas salas do Museu do Neo-Realismo em Vila Franca de Xira, até 3 de Março de 2019. Com clareza, inteligência e uma enorme sensibilidade expositiva, quase carinho.

... e a tela «Café» está ali exposta, vinda do Museu de Belas-Artes do Rio de Janeiro…

… e eu relembro como os meus pais falavam com admiração de Portinari, me deram a ler «A Selva» e eu, mais tarde, por influência da minha mãe, adquiri a obra «A Paleta e o Mundo» de Mário Dionísio… Artistas muito cá da casa!

jef, fevereiro 2019

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

Perdiz-vermelha (Alectoris rufa)
















Perdiz-vermelha; Perdiz-comum (Alectoris rufa)
Ordem Galliformes, Família Phasianidae

Quem não conhece a perdiz, exímia caminhante, trilhando em bando veredas entre searas, pomares ou bosques? Ave robusta mas fina que se mostra aos nossos olhos e nos olha, logo se esquivando, colina abaixo, todo o grupo, em voo planado, de envergadura arqueada. Avistamo-la antes de a perdermos entre urzes ou carrascos, tendo ouvido antes o seu canto de chamamento, um certo gargarejo rouco e cacarejado.

Patas, bico e olhos pintados de vermelho, as faces e a gola branca estão debruadas a negro, assim mosqueada a zona superior do peito que se colora de cinzento e de bronze. Os machos são mais volumosos, tarsos mais altos e esporões mais visíveis. As fêmeas mais discretas trazem a prol ligeira e atenta ao alimento, pequenas sementes, artrópodes e larvas, que esgaravatam no chão. Mais tarde, adultos, passarão quase exclusivamente a alimentar-se da mais variada dieta de vegetais, grãos, rebentos e pequenas bagas.

Mas se nos habituamos a vê-las a atravessarem-nos o caminho, nesses bandos gregários e familiares, é pela simples razão de que mais nós passeamos no Verão ou Outono, a época em que as aves se reúnem, pois lá para Dezembro isolam-se, tornam-se ainda mais discretas e começam a formar casais. Em Março começam as primeiras posturas em ninhos térreos entre restolho e arbustos e em Julho, pelo Sul de Portugal, ainda poderão estar no seu ninho a incumbar um número considerável de ovos que a média perfaz 12 ou 13.

É, certamente pela sua fertilidade, facilidade de perseguição, ou pelos seus 500g de carne suculenta, que esta ave de porte gracioso é a ave cinegética mais procurada em Portugal, tendo sido alvo de antiquíssimas campanhas de protecção, como por exemplo em decreto de D.João I, em 1396, que proibia a sua caça em coutadas de determinadas regiões do País. Muito mais recentemente e com o desenvolvimento das zonas de caça a perdiz-vermelha tem sofrido repovoamentos sistemáticos, por vezes adulterando a estrutura e a genética das populações autóctones.

jef, fevereiro 2019

Sobre o filme «Green Book - Um Guia Para a Vida» de Peter Farrelly, 2018
















Fico sempre dividido quando começam a aparecer no cinema os filmes dos óscares. Vou ou não vou vê-los, eis a questão. Não entendo muito bem porque têm, a maior parte deles, esta obrigação “pedagógica” de tocar, em veia  enciclopédica, quase pueril, os traumas recorrentes da grande nação americana, traumas que se iniciaram muito antes de ter aparecido a gravata vermelha do Trump. Traumas justos sobre questões hediondas.

É o caso real de um virtuoso pianista negro de formação erudita mas a tocar em trio de jazz, Don Shirley (Mahershala Ali), que contrata um motorista branco, de origem italiana, Tony Lip (Viggo Mortensen), para o levar em tournée pelos estados americanos do Sul. 1962. Um e outro confrontam-se ao longo da viagem com as características genéticas e culturais das suas próprias origens, também com os conceitos e preconceitos de um país enorme mas repleto de tradições e contradições abjectas.

Tudo acaba em bem, felizmente, na ceia de Natal e com uma longuíssima amizade, como indicam as notas no epílogo, tentando o realizador casar os «Amigos Improváveis» (Olivier Nakache e Éric Toledano, 2011) com «Do Céu Caiu uma Estrela» (Frank Capra, 1946).

Mas por que terá de ser tudo assim tão apalhaçado, tão linear e inflexível? Haverá razão para que todos os personagens sejam pintados como clichés dizendo as deixas um segundo depois do esperado enquanto belos carros coloridos cruzam as estradas num modo mais de museu do que de cinema?

Fica a banda sonora e a intenção (que na arte também é importante!)

jef, fevereiro 2019
                                                                      
«Green Book - Um Guia Para a Vida» (Green Book) de Peter Farrelly. Com Viggo Mortensen, Mahershala Ali, Linda Cardellini, Dimeter Marinov, Mke Hatton, Iqbal Theba, Sebastian Maniscalco, P. J. Byrne. Música: Kris Bowers; Fotografia: Sean Porter. EUA, 2018, Cores, 130 min.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Sobre o filme «Correio de Droga» de Clint Eastwood, 2018

















Após ter ficado mesmo muito zangado com Clint Eastwood à conta dos últimos três filmes – «Sniper Americano» (2014), «Milagre no Rio Hudson» (2016) e «15:17 Destino Paris» (2018) – três filmes (como todos os demais) sobre o “herói americano” mas onde a veia de defesa encarniçada das cores americanas e a estética moralmente desviada me fez pensar ter perdido para sempre um dos meus realizadores recorrentes e preferidos, chega «Correio de Droga». Um belíssimo filme de acção, suspense e humor, às mãos de um grande actor de 88 anos que interpreta um mau pai de família, de 90, veterano de guerra, falido cultivador de flores, sedutor e mulherengo, mas um passador de cocaína de sucesso!

Todo o cinema americano está lá. Todo o cinema de Clint Eastwood fica aqui resumido, nessa arte melodramática, muito sua, de cruzar os valores familiares desavindos com o riso de situações quase burlescas, terminando numa reconciliação benfazeja que deixa sempre no espectador as saudades do enorme espaço americano que jamais pisou.

E as  canções, e são muitas, que vão sendo ouvindas, são de génio.

jef, fevereiro 2019
                                                          
«Correio de Droga» (The Mule) de Clint Eastwood. Com Clint Eastwood, Bradley Cooper, Taissa Farmiga, Andy Garcia, Laurence Fishburne, Michael Peña, Dianne Wiest, Alison Eastwood, Ignacio Serricchio, Robert LaSardo, Noel Gugliemi, Eugene Cordero, Victor Rasuk. EUA, 2018, Cores, 116 min.