sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Sobre o filme «A Favorita» de Yorgos Lanthimos, 2018



















Nestas coisas de ‘filmes de época’, vai-me ficando o vício de ir à net em busca de qualquer coisa, apesar dos erros, das mentiras, das falsidades, que inundam tal éter... Wikipédia forever!

A saber. Parece que Anne teve um reinado curto de doze anos (1702-1714) mas foi uma mulher de armas, unindo a Escócia à Inglaterra, formando a primeira Grã-Bretanha. Foi uma rainha que fortaleceu o sistema parlamentar bi-partidário, entre os liberais ‘whigs’ e os conservadores ‘tories’. Pelo meio, as usuais contendas mais ou menos sangrentas com a França. Sim, consta que esteve 17 vezes grávida, nenhum dos filhos chegou à idade adulta, e tinha duas favoritas: Sarah Churchill, duquesa de Marlborough, e Abigail Masham, a baronesa Masham, que a ajudaram nas intrigas de quarto da ‘política democrática’.

Afinal, não consta que a rainha Anne (Olivia Colman) tivesse assim uma saúde tão débil, fosse lésbica, tomando-se de amores carnais, ora com Sarah Churchill (Rachel Weisz) ora com Abigail Masham (Emma Stone), mantivesse 17 coelhos no quarto e que fosse votada a luxuriosa e aguerrida vida no interior do seu sumptuoso palácio, revestido a belas madeiras e tapeçarias de encher o olho.

Contudo, existem fortes motivos para ver o filme. Acima de tudo, o facto de ser uma possível tragédia transformada numa ostensiva comédia, onde brilham os extraordinários fácies (em close-up) de actrizes maiores: Olivia Colman, Rachel Weisz e Emma Stone, colocando-as no centro de uma intriga política de limites bem palacianos, com dossel e tudo.

O realizador Yorgos Lanthimos toma em mãos tão cativante cenário, tão exagerado guarda-roupa, tão refinada banda sonora, tão estilizada iluminação, tão rico portfólio de pecados capitais e ainda lhe acrescenta um oitavo: não pára de filmar, ultrapassando a fronteira onde a decadência luxosa se transforma um pouco em exibição inútil. Por que razão usa a lente “olho de peixe” transformando todos os cenários em aquários convexos? Por que insiste na banda sonora repetida de dois tons, contrabaixo e percussão? Por que recorre sistematicamente à mesma escatologia para ‘enegrecer’ as cenas?

Se quisesse usar assim o guarda-roupa devia rever «My Fair Lady» (George Cukor, 1964).
Se quisesse usar o cenário e a escatologia podia dar uma espreitadela a «O Cozinheiro, o Ladrão, a sua Mulher e o Amante Dela» (Peter Greenaway, 1989).
Se desejasse usar a intriga da guerra e do palácio, da sedução e da mentira talvez devesse rever «Barry Lyndon» (Stanley Kubrick, 1977).

Apesar de tudo, um filme fora das guerras e das regras dos Óscares e de Hollywood. Também por isso vale a ida ao cinema.

jef, fevereiro 2019

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