Sinceridade,
recato e objectividade são os trunfos do primeiro filme de Paulo Carneiro, algo
parecido com um documentário, feito por episódios que são entrevistas realizadas
aos habitantes de Bostofrio, concelho de Boticas.
Vai em
busca da personalidade, do modo e da face do pai de seu pai que não lhe deixou
o nome no bilhete de identidade. Pai incógnito.
Sinceridade,
pois a primeira personagem é a do próprio "Paulo Carneiro" que se chega com
cautela e respeito aos vizinhos e parentes de um homem que já desapareceu e que
dele falam com medo ou pudor. "Paulo Carneiro" é a personagem principal.
Recato,
pois este filme tem a qualidade de respeitar os silêncios dos falantes,
deixando o passado numa espécie de redoma de ausência que não pode ser tocata e,
portanto, dela não sairá o tão desejado conhecimento. Daí que jamais se
conhecerá o rosto completo do avô através da fotografia colocada na lápide do
cemitério. A única fotografia existente que vai sendo mostrada por trechos ampliados,
cheios “grão” (ou “pixéis”), nos separadores dos diversos
episódios-entrevistas.
Objectividade,
porque a história vai sendo construída de modo sólido, não só pela figura
carismática e pujante do avô mas, principalmente, pela figura sofrida,
acarinhada mas perturbada da avó.
Um belo
passo do cinema “realista” português que já contava com Manoel de Oliveira,
Fernando Lopes, António Reis e Margarida Cordeiro, Pedro Costa, Manuel Mozos,
Miguel Gomes ou Leonor Teles
Como
complemento, vê-se a curta «Cinzas e Brasas» de Manuel Mozos baseada numa
história “real” de Dulce Maria Cardoso. Contada a dois tempo, num longo arco
cronológico. Talvez o filme se perca em tão curto tempo cinematográfico mas encontra-se
na esplêndida imagem e na maravilhosa (e eternamente bela) Isabel Ruth.
jef, novembro
2019
«Bostofrio, où le ciel rejoint la terre» de Paulo Carneiro. Argumento: Paulo Carneiro.
Fotografia: Pedro Neves. Som: Ricardo Leal. Montagem: André Valentim Almeida,
Francisco Moreira, Paulo Carneiro. Produção: Paulo Carneiro, Red Desert.
Portugal, 2018, Cores, 70 min.
Em
complemento: «Cinzas e Brasas» de Manuel Mozos. Com Isabel Ruth, Gustavo
Sumpta, Ana Ribeiro. Segundo ideia de Dulce Maria Cardoso. Portugal, 2015,
Cores, 21 min.
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