Eis a definição de Hollywood e do seu cinema, segundo este
livro:
«Foi um enorme alívio poder discutir tamanha parvoíce inane e
ridícula; só mesmo uma loucura assim para curar a minha loucura galopante. De facto, trabalhar em cinema é como fazer
amor com uma gárgula, ocorreu-me. Acordamos
e damos por nós nas garras de um pesadelo de mármore e então pensamos: “Mas que
raio estou eu a fazer aqui?!” Isto é só gente a mentir e a fazer caretas. Tudo
por causa de um filme que, depois, vinte milhões de pessoas correrão a ver, ou
do qual fugirão a correr!»
Um jovem argumentista, tão promissor quanto medroso e inseguro
é chamado, através de uma nota anónima, ao muro que separa os estúdios da
Maximus Films do cemitério contíguo. Será à meia-noite da noite de Halloween de 1954.
Porém, o horrível facto observado é, por medo, silenciado e apenas confidenciado
ao seu grande amigo e colega de liceu, o genial aderecista Roy Holdstrom. Um
facto que relembra um terrível acidente de viação ocorrido ali mesmo, vinte
anos atrás.
Com uma graça incrível e uma aceleração de narrativa única, o
autor presta homenagem à sua Hollywood, espampanante, delirante e grotesca,
regressada dos tempos do cinema mudo, quando as fotografias das divas eram autografadas
em delírio. É como um livro para crianças que não tenham medo do escuro, de
cemitérios, de monstros ou túneis misteriosos.
Ray Bradbury nunca deixa as personagens à deriva, tratando-as com carinho e devoção, quase com comovente comoção familiar: Elmo Crumley, o detective com jardim tropical, a nadadora Constance, Henry, o cego farejador, o Fritz Wong, de monóculo à Fritz Lang, Maggie Botwin, a exímia costureira de pedaços de película. Também lugares comoa Green Town ou a Venice, California. Todos saem da imensa ternura de Bradbury, revisitando espaços e figuras de «A Morte É um Acto Solitário» (1985).
Um extraordinário livro de aventuras a meio caminho da
conclusão do filme «Cristo e César» e o início da rodagem de «Os Mortos Chegam
Depressa». Ou seja, um filme rodado entre a «Sunset Boulevard» (Billy Wilder,
1950) e a «Mulholland Drive» (David Lynch, 2001), onde apenas por acaso não
participam os produtores de «Quem Tramou Roger Rabbit?» (Robert Zemechis,
1988).
O melhor livro de férias para divertir os amantes do cinema clássico
americano (e mundial).
jef, agosto 2022
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