Expor as reais e eternas cicatrizes
deixadas na família pelo suicídio de um irmão gémeo, na flor da idade, forte
e bonito, mas encarcerado numa espécie de véu depressivo entre a devoção
familiar e a falta de auto-estima, de força de vontade, de crença no dia que virá.
Camillo Bellocchio morre
com 29 anos de idade cobrindo com a penumbra de arrependimento e remorso toda a
família. Em especial o seu irmão gémeo, Marco, o realizador, que vai descrevendo
como aquela grande tribo e os seus desenlaces trágicos lhe marcaram a carreira
cinematográfica. Nascidos os dois poucos dias depois da invasão da Polónia pela Alemanha,
em 1939, Marco Bellocchio vai também narrando a história de Itália do fim da
guerra e do referendo em 1946 que deliberou o fim da monarquia italiana e o
exílio de Humberto de Saboia em Cascais, passando pelas revoltas estudantis
marxistas-maoistas nos anos sessenta. Marco tenta levar Camillo para as lides
revolucionárias da ditadura do proletariado e do maoismo a que Camillo contrapõe: «Marx pode
esperar!»
É um filme-documentário
realista muito fora do comum sobre a sinceridade catártica de uma família que
jamais pode superar ou sublimar um drama incontornável e inolvidável.
O próprio suicídio
encerra um respeito silencioso pela dor interior e inexplicável do suicida mas
também pelo sofrimento incalculado dos que, em seu redor, lhe sobrevivem.
Contudo, e apesar de ser
um filme importantíssimo sobre uma substância implacável, falta-lhe um qualquer
grão narrativo que nos deixa a alguns centímetros do fulcro emocional. Pelo
menos, foi o que me aconteceu. Eu que choro por tudo e por nada.
jef, agosto 2022
«Marx Pode Esperar» (Marx
Può Aspettare / Marx Can Wait) de Marco Bellocchio. Com Alberto
Bellocchio, Letizia Bellocchio, Marco Bellocchio, Maria Luisa Bellocchio,
Piergiorgio
Bellocchio, Pia Bareggi, Elena Bellocchio, Pier Giorgio Bellocchio, Francesco
Bellocchio, Gianni Schicchi, Giovanna Capra, Virgilio Fantuzzi, Luigi
Cancrini, Pavel Zelinskiy. Argumento: Marco Bellocchio. Produção: Beppe
Caschetto, Simone Gattoni. Fotografia: Michele Cherchi Palmieri, Paolo Ferrari.
Itália, 2021, Cores, 96 min.
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