Parece ser o filme-corolário para Pedro Almodóvar, uma espécie de passo em
frente no melodrama, depois de tantos outros. Principalmente depois de “Tudo
sobre a Minha Mãe” (1999) ou “Fala com Ela” (2002). Um filme inevitável para um
realizador esteta e inquieto, diria mesmo, um realizador aflito. As portas de
Hollywood abrem-se para as suas dúvidas primordiais: a morte, a religião, a
sexualidade. Acima de tudo, o dramatismo pungente do afecto no interior de um
mundo adverso, arriscado, à beira do abismo.
Pedro
Almodóvar não perde a oportunidade. Também não perde o ensejo de ter
Tilda Swinton e Julianne Moore como sublimes peças cúmplices a darem voz e
intensidade ao drama da morte consentida e ansiada. É impossível não recordar o
rigor estético de um outro melodrama com Julianne Moore: «Longe do Paraíso»
(Todd Haynes, 2002). Ambos e recordar a elipse teatral dos filmes de Douglas
Sirk. A música conclusiva de Alberto Iglesias, como naquele, a de Elmer
Bernstein.
Mas
os tempos mudaram, o mundo de hoje chega com novas tragédias, e Pedro Almodóvar
não consegue colocar de parte os pesadelos que o assolam. Tem urgência em
situá-los a todos, mesmo que surjam no filme um pouco como anexos panfletários
à narrativa principal. Não importa. Estão lá, para confrontar o mundo (e a
América), já que tem a ocasião de os mostrar de modo planetário!
E
revela tudo através daquelas soberbas actrizes, singelas, misteriosas, elementares,
situadas dentro de decores e planos que, uma vez mais, deixam a vontade no
espectador de os olhar em contínuo como acontece nas evocadas pinturas cenográficas
de Edward Hopper ou Andrew Wyeth.
Sem
abdicar de qualquer dos seus princípios, Pedro Almodóvar não perde a ocasião de
nos confrontar com o seu mundo. Também não perde agora a oportunidade de expor
o seu abecedário estético, cromático, político e emocional à
fragilidade de um planeta em ruptura.
A
rever.
jef,
dezembro 2024
«O
Quarto ao Lado» (The Room Next Door) de Pedro Almodóvar. Com Tilda Swinton,
Julianne Moore, John Turturro, Alessandro Nivola, Juan Diego Botto, Raúl
Arévalo, Victoria Luengo, Alex Høgh Andersen, Esther McGregor, Alvise Rigo, Melina
Matthews, Sarah Demeestere, Anh Duong, Bobbi Salvör Menuez, Annika Wahlsten, Shane
Woodward, Paolo Luka Noé, Cristina Kovani, Nya Bowman. Argumento: Pedro
Almodóvar segundo o romance de Sigrid Nunez. Produção: Agustín Almodóvar, Esther García. Fotografia:
Eduard Grau. Música: Alberto Iglesias. Guarda-roupa: Bina Daigeler. Cenografia:
Kendall Anderson, Carlota Casado, Iker Elias. Espanha, 2024, Cores, 107 min.
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