sexta-feira, 7 de novembro de 2025

Búzio Vácuo Longínquo Voo









Búzio Vácuo Longínquo Voo

Existe alguma coisa na saudade que constrange mas, ao mesmo tempo, completa e liberta. Qualquer coisa de indefinido e orgânico, como aquele meio tom sustenido, preso na tecla preta de uma harmonia menor e perdida na escala diatónica. Parece estar a mais, mas se não a ouvimos sentimos que a melodia se incompleta.

A própria saudade dá azo à inexistência, ao longínquo, ao que não se alcança, mas como sendo pensada, ali, agora, torna-se próxima, tangível. Como a onda muito física e aquática que avança. Nós desejamos segurá-la mas, tão pouco solidária com a nossa vontade, vai recuando inexorável. Deixando apenas sobre a areia brilhante um búzio de um molusco que já é passado mas, contudo, é tomado por um crustáceo com uma nova casa, a ausência, a saudade, afirmando-se como consolo momentâneo. Memória eremita.

O amor é diverso e conjugado somente no dia de hoje. Uma espécie de bando barulhento de aves verdes, periquitos gralhadores, que nos alcançam a vista com entusiasmo e alegria, sobrevoando o coração e ocupando toda a nossa atenção, ou seja, a totalidade do nosso campo de visão emocional.

Mas apenas pelo breve momento em que o bando nos atravessa. Logo depois se esconde, ruidosamente ausente, nas ramagens frondosas e escuras das árvores de um cemitério próximo. Fica-nos, deste modo, apenas a imagem passada para memória futura. E abraçamos assim a saudade, a concha libertadora.

7 de Novembro de 2025

jef

 

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