Búzio Vácuo Longínquo Voo
Existe
alguma coisa na saudade que constrange mas, ao mesmo tempo, completa e liberta.
Qualquer coisa de indefinido e orgânico, como aquele meio tom sustenido, preso
na tecla preta de uma harmonia menor e perdida na escala diatónica. Parece
estar a mais, mas se não a ouvimos sentimos que a melodia se incompleta.
A
própria saudade dá azo à inexistência, ao longínquo, ao que não se alcança, mas
como sendo pensada, ali, agora, torna-se próxima, tangível. Como a onda muito
física e aquática que avança. Nós desejamos segurá-la mas, tão pouco solidária
com a nossa vontade, vai recuando inexorável. Deixando apenas sobre a areia
brilhante um búzio de um molusco que já é passado mas, contudo, é tomado por um
crustáceo com uma nova casa, a ausência, a saudade, afirmando-se como consolo
momentâneo. Memória eremita.
O
amor é diverso e conjugado somente no dia de hoje. Uma espécie de bando
barulhento de aves verdes, periquitos gralhadores, que nos alcançam a vista com
entusiasmo e alegria, sobrevoando o coração e ocupando toda a nossa atenção, ou
seja, a totalidade do nosso campo de visão emocional.
Mas
apenas pelo breve momento em que o bando nos atravessa. Logo depois se esconde,
ruidosamente ausente, nas ramagens frondosas e escuras das árvores de um
cemitério próximo. Fica-nos, deste modo, apenas a imagem passada para memória futura.
E abraçamos assim a saudade, a concha libertadora.
7 de Novembro de 2025
jef

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