Na cena final, Ginny (Kate Winslet) regressa ao exterior, à
brisa do anoitecer, saindo do palco envidraçado, da claustrofobia, do calmo
desvario onde entrou. Aproxima-se da plateia de vestido comprido, maquilhada,
talvez louca, talvez alcoolizada. Vem só. Repete, mais uma vez, que não irá à
pesca com o marido no fim-de-semana.
Sem saber bem por que razão, esta cena lembrou-me Gloria
Swanson, a Norma Desmond a descer a escadaria do «Crepúsculo dos Deuses» (Billy
Wilder, 1950) ou Elizabeth Taylor, a Maggie Pollitt em «Gata em Telhado de
Zinco Quente» (Richard Brooks, 1958).
Também me fez lembrar os últimos dramas femininos que Woody
Allen criou para as arrebatadoras Scarlett Johansson («Match Point», 2005) e Cate
Blanchett («Blue Jasmine», 2013).
Woody Allen é único nessa presunção de que o teatro é rei e
senhor entre a tragédia e a comédia, entre o sentir plástico de cada cena e o
deslumbramento estético tão feérico e demente como o mar infinito que observa
de perto o Parque de Diversões de Coney Island. Tudo é risível e profundamente
triste. Aqui tudo brilha. As cores da feira, a praia repleta de
banhistas, belas e aprimoradas, e banheiros apessoados que gostam de teatro de Eugene
O’Neill, da tragédia grega e moram em Greenwich Village - Mickey (Justin Timberlake). Por
contraste, os feirantes vivem naqueles anos 50 que tentavam sair da memória
quente de uma grande guerra e aproximavam-se de terríveis guerras mais frias.
Aqui o romantismo é existencialista. A brutalidade é interior
e a esperança termina em resignação. Ginny, como Norma Desmond ou Maggie Pollitt, parecem desmoronar-se
e com elas o mundo que as sustenta. Afinal, o tempo nunca é o suficiente para
obviar o destino. Aprendemos isso com Tennessee Williams mas também com Anton
Tchekhov. Aprendemos também com Ingmar Bergman, com John Huston e com Woody
Allen que tão bem os secunda.
O que seria o final do ano sem o luminoso teatro de Woody
Allen?
jef, dezembro 2017
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