Não fosse uma comédia triste sobre um
homem, poeta e editor, e as suas quatro mulheres (incluindo a derradeira e
ausente da câmara, a própria filha) e poderíamos dizer que estávamos frente às
comédias de enganos à Beaumarchais ou Marivaux, precedentes de bastilhas e
revoluções.
Mas não. Esta é uma comédia triste de um
homem e das suas mentiras e dos desejos que o fazem meter os pés pelas mãos, a
líbido pela verdade. Caso contrário, até encontraríamos alguma parecença com os
filmes de Woddy Allen.
Mas não. A luz desabrida e crua, certamente
bela, sobre os enquadramentos sérios; o preto e branco a definir e enquadrar o frontal
constrangimento das quatro personagens; a filmagem do diálogo sempre lado-a-lado,
eliminando o subterfúgio do campo-contra-campo, atira aos espectadores a
melancolia mais certeira do dia-a-dia. O álcool a revelar as lágrimas.
Nada é mais austero e triste,
simultaneamente, caricatural e quase cómico, que a amargura transportada pelo esquecimento
do dia seguinte. Nada mais confrangedor que o esquecimento de uma nota com um
poema de amor deixada sobre a indiscrição de uma mesa.
Uma bela e simples peça de teatro sobre
a normalidade da mentira e a verdade dos afectos.
jef,
dezembro 2017
«O
Dia Seguinte» (Geu- hu) de Hong Sang-soo. Com Cho Yunhee, Ki Joabang, Kim
Min-hee, Kim Sae-byeok, Kwon
Hae-hyo. Coreia do Sul, 2017, Cores, 92 min.
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