O mais interessante no
filme é a gestão do suspense criado no espectador, despoletado pelo stress, pela
angústia, pela ansiedade, do personagem principal Christian (Claes Bang). E
Christian, com a fleuma possível, assim, atirado para o meio do conflito do
qual ele poderá ser culpado mas jamais incriminado. Ele está inocente, é um homem
bom no centro de azares consequentes que convivem apressados no interior de uma
comédia sobre a arte contemporânea, as suas curadoria e divulgação, a liberdade
de expressão, a sobrevivência económica da estética apesar dos mecenas.
Um filme que é como as
matrioskas russas. Um filme onde não sabemos se devemos rir com o inicial desastre
ocorrido com a estátua que está a ser removida da praça central para dar lugar
a «O Quadrado», ou, pelo contrário, se nos devemos afligir com a claustrofobia vertiginosa e
magnificamente filmada dos vãos de escadas e degraus percorridos em pulsão de
fugitivo ou pesar de condenado. Lembro «Vertigo» de Hitchcock (1958), um dos
melhores filmes de sempre!
A arquitectura dos
enquadramentos e decores é de um rigor estético que deixa o espectador dentro
da realidade encenada dos cenários e que se torna um dos factores mais
surpreendentes do filme. Mais artístico, digamos.
A interpretação das
três crianças é qualquer coisa que está no limbo do inacreditável. Tal como em
«Força Maior» (2014), a questão infantil tem o papel central no desenvolvimento
da desconfiança e, por reflexo, da inquietude demonstrada pelos adultos. Ruben
Östlund é excelente a revelar as fraquezas dos adultos tornados crianças
instáveis e medrosas, como fora Michael Haneke em Brincadeiras Perigosas (1997) ao
colocar a adolescência no limite adulto e abstracto do terror.
Contudo, a última
matrioska, a crítica maior sobre a divulgação e banalização da arte
contemporânea e do respectivo sustento financeiro e do seu confronto com a
liberdade criativa, fica pelo caminho, entre alguns sorrisos, talvez
gargalhadas, e algumas frases já muito vistas. Será esse também um outro ponto
de conflito intencional do realizador? Porque em 1917, Marcel Duchamp
fez melhor com aquele objecto de porcelana branca a que chamou «A Fonte» e que
algum júri de concurso rejeitou por não incluir qualquer labor artístico.
jef, dezembro 2017
«O Quadrado» (The
Square) de Ruben Östlund. Com Claes Bang, Elisabeth Moss, Dominic West,
Terry Notary, Christopher Læssø. Palma de Ouro 70º Festival de Cannes. Suécia, Dinamarca,
Alemanha, Reino Unido, 2017, Cores, 142 min.
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