Num
vasto quadro de planos irreais, quase renascentistas, quase impressionistas, natureza-morta,
paisagem-cristalizada, a veracidade dos adereços são coisa pouca. Cenários e personagens movem-se em torno da princesa portuguesa, entediada e herege, von
Ketten (Clara Riedenstein), enquanto esta aguarda o seu marido que partiu novamente
para a guerra. Von Ketten (Marcello Urgeghe) deseja arrebatar as terras do Bispo
de Trento, no norte de Itália; deseja ainda a aventura bélica, que a paz podre
não lhe serve.
O
filme-pausa sai de uma novela de Robert Musil.
A
cena em que a Portuguesa galopa contra o fundo verde de uma floresta que lhe
escapa é talvez o tópico maior da intuição estética da realizadora Rita Azevedo
Gomes. Essa imagem é como um mural reactivo perante a nova vida da Portuguesa,
passada entre animais cativos e folhada morta. O manto florestal combina com os
tecidos e as paredes, os brocados e o nevoeiro. Muito de Ofélia sobreviva e
lírica aqui se desvenda. Muito também é construído pela fotografia de Acácio de
Almeida. Outro tanto pelo diálogo de Agustina Bessa-Luís, ainda mais ajudado
pela banda sonora composta por José Mário Branco.
Um
filme a contemplar.
jef,
fevereiro 2019
«A
Portuguesa» de Rita Azevedo Gomes. Com Clara Riedenstein,
Marcello Urgeghe, Rita Durão, Pierre Léon, Luna Picoli-Truffaut, João Vicente,
Adelaide Teixeira, Manuela de Freitas, Alexandre Alves Costa, Ingrid Caven.
Argumento: Rita Azevedo Gomes segundo texto de Robert Musil. Diálogos: Agustina
Bessa-Luís. Director de Fotografia: Acácio de Almeida. Som:
Olivier Blanc. Música: José Mário Branco Portugal, 2018, Cores, 136 min.
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