terça-feira, 10 de setembro de 2019

Sobre a exposição «Coisa Perene entre a Casa e o Crânio» de Paulo Romão Brás, Angra do Heroísmo 2019


















O Paradigma da Cor

No conjunto de obras que o autor intitulou «Coisa Perene entre a Casa e o Crânio» existe uma substância exemplar. Encerra algo estruturalmente paradigmático, no sentido etimológico. Quero dizer, aqui, Paulo Romão Brás desestrutura e volta a reorganizar não para simplificar ou edificar mas para exemplificar. Como reordenando as peças do Lego com a intenção de introduzir no dicionário de antónimos uma nova palavra gráfica ou um recorte simbólico inesperado. Exemplos (ou paradigmas) que se opõem entre si para vermos mais claro.

Duas das unidades orgânicas, a linha e a forma, ficam nitidamente aprisionadas pela terceira circunstância: a cor. É ela que contradiz, se opõe, tornando-se mais livre e ‘paradigmática’. Suspeitamos que a obra do autor aguardava há algum tempo por tal contradição libertadora. Da sua génese recorde-se «As Sombras Errantes» (Galeria Má Arte - Aveiro, 2014) ou «Arqueologia» (Balla - Livro/CD, 2016).

As impressões sobre papel 100 x 70 cm executadas de modo quase displicente para corresponder ao trabalho que sobre elas será executado posteriormente, sugerindo rasura, decomposição, dúvida (pastel, acrílico, caneta,…), parecem exigir esse espaço novíssimo, mais amplo, quase ilimitado por ausência da velha norma. As cores das peças de menor dimensão entram para redireccionar as primeiras. As demais obras, a três dimensões, não se apelidarão ‘esculturas’ mas simplesmente exemplos de um olhar mais físico, mais centrado na referida evolução cromática. Paradigma da luz.

Tal como a ‘arquitectura’ de Fernand Léger desejava libertar-se do formalismo sentimental da figura humana, planificando-a, adoçando-lhe os vértices cubistas, para a elevar ao superior termo pictórico da abstracção, também Paulo Romão Brás tende a reorientar as linhas recortadas em planos diferentes e profundidades de campo quase paralelas. São contornos curvos ou rectilíneos do presente de certos objectos reais que deixam o olhar do leitor entrar num ‘país das maravilhas’ futurista, descobrindo aí, alternadamente, o seu-nosso amor, o seu-nosso temor. Talvez, antes, para chegar à planificação do passado, refazendo a nossa memória insuspeita, desconexa e onírica.

Encontramos em «Coisa Perene entre a Casa e o Crânio» o ponto e a vírgula de um sintagma esclarecedor, porque exemplificativo. «Descubra o que está por trás!» A frase que nos guiará nesse jogo infantil do troca-pernas-e-cabeças da estética formal entre as linhas, as formas e as cores de Paulo Romão Brás.

jef, setembro 2019


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