O Paradigma da Cor
No conjunto de obras que
o autor intitulou «Coisa Perene entre a Casa e o Crânio» existe uma substância
exemplar. Encerra algo estruturalmente paradigmático, no sentido etimológico.
Quero dizer, aqui, Paulo Romão Brás desestrutura e volta a reorganizar não para
simplificar ou edificar mas para exemplificar. Como reordenando as peças do
Lego com a intenção de introduzir no dicionário de antónimos uma nova palavra
gráfica ou um recorte simbólico inesperado. Exemplos (ou paradigmas) que se
opõem entre si para vermos mais claro.
Duas das unidades
orgânicas, a linha e a forma, ficam nitidamente aprisionadas pela terceira
circunstância: a cor. É ela que contradiz, se opõe, tornando-se mais livre e
‘paradigmática’. Suspeitamos que a obra do autor aguardava há algum tempo por
tal contradição libertadora. Da sua génese recorde-se «As Sombras Errantes»
(Galeria Má Arte - Aveiro, 2014) ou «Arqueologia» (Balla - Livro/CD, 2016).
As impressões sobre papel
100 x 70 cm executadas de modo quase displicente para corresponder ao trabalho
que sobre elas será executado posteriormente, sugerindo rasura, decomposição,
dúvida (pastel, acrílico, caneta,…), parecem exigir esse espaço novíssimo, mais
amplo, quase ilimitado por ausência da velha norma. As cores das peças de menor
dimensão entram para redireccionar as primeiras. As demais obras, a três
dimensões, não se apelidarão ‘esculturas’ mas simplesmente exemplos de um olhar
mais físico, mais centrado na referida evolução cromática. Paradigma da luz.
Tal como a ‘arquitectura’
de Fernand Léger desejava libertar-se do formalismo sentimental da figura
humana, planificando-a, adoçando-lhe os vértices cubistas, para a elevar ao
superior termo pictórico da abstracção, também Paulo Romão Brás tende a
reorientar as linhas recortadas em planos diferentes e profundidades de campo
quase paralelas. São contornos curvos ou rectilíneos do presente de certos
objectos reais que deixam o olhar do leitor entrar num ‘país das maravilhas’
futurista, descobrindo aí, alternadamente, o seu-nosso amor, o seu-nosso temor.
Talvez, antes, para chegar à planificação do passado, refazendo a nossa memória
insuspeita, desconexa e onírica.
Encontramos em «Coisa
Perene entre a Casa e o Crânio» o ponto e a vírgula de um sintagma
esclarecedor, porque exemplificativo. «Descubra o que está por trás!» A frase
que nos guiará nesse jogo infantil do troca-pernas-e-cabeças da estética formal
entre as linhas, as formas e as cores de Paulo Romão Brás.
jef, setembro 2019
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