Este
é um caso raro no cinema de Pedro Almodóvar. O cineasta faz centrar a atenção
do espectador no que interessa e obriga-o a esquecer que está a ver um filme de Pedro Almodóvar.
Não é bem uma comédia de costumes, nem deixa de ser. Não é um melodrama
trágico, apesar de tudo o indicar. Como sempre, tem a música de Alberto
Iglesias, a produção de Agustín Almodóvar, uma torradeira vermelha em forma de
autocarro, quadros na parede de autores famosos, o guarda-roupa colocado ao milímetro
sobre a luz excepcional, as cores e os decores abertos ao pantone e em esquadria.
Também as coincidências narrativas que fazem a boa ficção ser verosímil e de
que o cinema de Almodóvar está carregado emocionalmente.
Então, por que saem os espectadores um pouco de cara à banda? Talvez porque existe uma
entrega total de Antonio Banderas (premiado em Cannes) a um papel que poderia ser
representado por Pedro Almodóvar. E, em simbiose, porque é um acto de quase amor
do realizador oferecendo o papel que mimetiza a vocação dramática de Antonio
Banderas, e por que este tanto ansiava.
Antes
de mais, o espectador fica suspenso, sem saber bem se é um filme típico do
realizador, pois é difícil receber como diversão um acto dramático tão cru, tão
puro, sobre a idade que, impiedosa, vai cobrindo a vida de memórias rasuradas e
dias futuros cada vez menos brilhantes e mais dolorosos.
jef,
setembro 2019
«Dor
e Glória» (Dolor y Gloria) de Pedro Almodóvar. Com Antonio Banderas, Asier
Etxeandia, Leonardo Sbaraglia, Penélope Cruz, Raúl Arévalo, Julieta
Serrano, César Vicente, Nora Navas, Susi Sánchez, Julián López,
Agustín
Almodóvar. Música: Alberto Iglesias. Espanha, 2019, Cores, 113 min.
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