terça-feira, 17 de setembro de 2019

Sobre o filme «Santiago, Itália» de Nanni Moretti, 2018












Nanni Moretti não consegue fazer um filme igual a outro. Melhor, Nanni Moretti assume sempre, antes de mais, o seu papel de cidadão, político, social, familiar e emocional. Como realizador, como actor, como persona que tem de falar perante um mundo que, por vezes, gira em sentido retrógrado. Assim como a memória que deve ser resgatada. A única imagem sua é a do confronto com um carrasco, preso, que insiste de modo néscio em fazer-se perdoar perante uma entrevista que deseja imparcial. «Eu não sou imparcial!», responde secamente o realizador.

Este documentário inicia-se com uma série de entrevistas a chilenos que tão bem falam a língua italiana. Facto estranho… Falam eles dos momentos de alegria do governo de Salvador Allende, eleito democraticamente. Ouvem-se gritos dos manifestantes felizes. «O povo unido jamais será vencido!» Porém, o tom dos discursos começa a toldar-se e chegamos ao sangrento golpe militar de Augusto Pinochet. 11 de Setembro de 1973.

Depois, existe um ângulo morto no muro da Embaixada Italiana que se manteve aberta durante o horror. Esse muro não era suficientemente alto. Tinham de saltar. O muro deu asilo a perto de 750 refugiados. A fluência em italiano destes cidadãos, agora com duas pátrias, estava explicado. eles não esquecem o papel benévolo do país de acolhimento. Há quem lembre que a Itália de 1973 pouco tem a ver com a actual Itália de Salvini.

Talvez seja um documentário que termina de modo abrupto com uma festa dos chilenos-italianos mas é um documentário importante e comovente. Principalmente para quem não esquece que, de 11 de Setembro de 1973 a 25 de Abril de 1974, passaram poucos meses e que, acima de tudo, as palavras migram de continente para continente.

jef, setembro 2019

«Santiago, Itália» de Nanni Moretti. Documentário. França / Itália / Chile, 2018, Cores, 80 min.

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