Agora que estou a chegar ao 600º texto colocado neste blogue,
tenho de dar lugar a alguém que comprova a minha teoria ‘La Palice’ de que ‘o
melhor das palavras, escritas ou não, é mesmo as pessoas’ e, de entre todas, as
melhores são os amigos que se tornam cúmplices e justificam, pescadinha de rabo
na boca, os próprios textos que escrevemos.
Pedro Toda a Gente, acrítico literário, alter ego do grande Pedro Castro Henriques, no dia 23 de Novembro,
na Biblioteca Camões, por ocasião da apresentação do primeiro livro editado pel’A
Morte do Artista’, «O Ciclo Curvo das Noites» de Paulo Romão Brás & João
Eduardo Ferreira, levanta-se e diz, resumino melhor que ninguém esta tarefa de
ilustrar e escrever qualquer coisa que tem a importância que cada momento lhe
dá ou lhe retira.
Serve ainda o mesmo momento, antes de passar a palavra
ao acrítico literário, Pedro Toda a Gente (PTG), para afirmar que gostamos muito
de ti, PCH (Pedro Castro Henriques).
jef, dezembro 2019
a ler vamos:
«Agradeço aos autores a confiança depositada num anónimo
leitor do pictórico e do literário colocando-me na posição de uma amiga do João
Eduardo Ferreira, mulher de vários predicados que, anos atrás, aquando do
lançamento de um livro me sussurrava ‘o João escreve tão bem… mas eu não
percebo nada do que ele diz!’ Opiniões. Nem o autor se incomoda com o leitor,
nem o leitor se incomoda com o autor. Livro comprado, cada qual faz dele o que
melhor lhe aprouver.
«O Sr. Toda a Gente olha desconfiado para o negro da capa,
tem dificuldade em ler o título e pensa desde logo na morte do artista. O Sr.
Toda a Gente vê quando vê e lê quando lê o que significa que, feitas as contas,
vê pouco e lê pouco mas lá se o faz bem ou mal, não sei. O Sr. Toda a Gente
lida com as coisas simples da vida que por serem simples até se reduzem a
siglas: FMI de Fundo Monetário Internacional, ATN de Autoridade Tributária
Nacional, PSP de Polícia de Segurança Pública, SNS de Serviço Nacional de Saúde
e mais umas quantas. Para o Sr. Toda a Gente as coisas simples da vida
dificilmente rimam com ilustrações ou escritas. O Sr. Toda a Gente até admite
que ilustração e escrita rimem com as coisas simples da vida mas isso, pensa
ele, é coisa para iluminados. Mas o Sr. Toda a Gente, por razões que a razão
desconhece como diria o outro, adquiriu O Ciclo Curvo das Noites um pouco
influenciado pela filha, a Verinha, que deu para ir para letras e lhe azucrina
o espírito com intelectualices. Adiante. Aberto o livro, o Sr. Toda a Gente
raciocina, organiza-se para avançar ou para desistir de vez.
«E eis o Sr. Toda a Gente confrontado com Paulo Romão Brás
São dezasseis páginas ou meias horas que somam as oito
horinhas que a OMS (Organização Mundial de Saúde) e diversas autoridades exigem
de dormida ao Sr. Toda a Gente. Essa dezasseis páginas resumem o próprio ciclo
turvo das noites do Sr. Toda a Gente a oscilar entre breves períodos de sono
profundo e outros tantos repentes em que o quotidiano se mete onde não é
chamado. Ora Paulo Romão Brás (ainda não é PRB para o Sr. Toda a Gente,
portanto não faz parte das coisas simples da vida), faz-nos entrar
redondadamente na cama na p.1, que é como o Sr. Toda a Gente entra na cama,
tirando-nos da mesma, quadradamente, na p.16, que é como o Sr. Toda a Gente sai
da cama. ‘O gajo viu bem a coisa, diz para consigo próprio o Sr. Toda a Gente,
e até nas cores…’ Há uns negros, o 4975C do Pantone (o Sr. Toda a Gente
trabalha na Fernandes – sector ‘desenho’), à mistura com muitos azuis, a
oscilarem no Pantone entre o 290C e o 2736 C. O branco não incomoda o Sr. Toda
a Gente que o tem por ausência de côr. ‘À noite é assim, conclui o Sr. Toda
Gente, o azul da serenidade e o negro do medo’ como ouviu há dias na TV. Paulo
Romão Brás não escreve, ilustra o que para o Sr. Toda a Gente explica o porquê
do mesmo não ter direito a paginação numerada. Se ‘uma imagem vale mil palavras
está-se mesmo a ver o tamanho que o livro iria ter!’ E está a parte de
ilustração despachada!
«O Sr. Toda a Gente detém-se agora em João Eduardo Ferreira.
«O Sr Toda a Gente, como português de lei (recordo, trabalha
na Fernandes) diz-se vítima do quotidiano, não sabendo como o enfrentar nem
como convencer os demais para o que quer que seja que ponha em causa os seus
hábitos quotidianos. O Sr. Toda a Gente anda enervado. Perturbam-no as
histórias de clima com que agora o massacram, a despensa, a despensa ainda lhe
mata a fome mas…, a fechadura lá de casa, mais apostada em abrir do que fechar
ou vice-versa, quando abre a boca por via de regra sai asneira, não sabe o que
fazer dos brinquedos (as bonecas com que a Verinha brincava e que agora, desde
que se deu às letras…) nem tem opinião segura sobre as aulas, sonha não fazer
nenhum e quanto ao aturar da vizinhança nem se fala. Na leitura, coisa que
pouco pratica, o Sr. Toda a Gente procura respostas. Em O Ciclo Curvo das
Noites inclinou-se a princípio para A agenda (p.54), ‘deixa ver se é como a
minha’. Mas não, a agenda do livro em nada se aparentava à sua – sobra da Fernandes
– não percebeu mesmo a passagem em que se diz ‘porque escreves nesta agenda de
merda?’ Mas o Sr. Toda Gente (tinha que rentabilizar o livro) descobriu que
João Eduardo Ferreira tem remédio para muito daquilo que o apoquenta e ao Sr.
Toda a Gente, remédio sem título, é certo, e que nem sequer consta do Registo
Nacional de Medicamentos. A bula (caso fosse pontifícia vendia-se que nem
pãezinhos quentes) publicada na p.30 não passou desapercebida ao Sr. Toda a
Gente que a elegeu como seu poema favorito. (Definir estratégias / Propor consensos / Estabelecer prioridades /
Manter a calma. Avaliar a pressão atmosférica / Abastecer a despensa / Mudar as
fechaduras / Calar a boca. Vestir as bonecas / Faltar às aulas / Arregaçar as
mangas / e Matar o vizinho.). ‘Mais claro não se pode ser’, concluiu o Sr.
Toda a Gente ciente de ter programa em que pensar. ‘Enfim, remédios…
acrescentou o Sr. Toda a gente… a seguir assim este sacana vai longe na
´política!’ E não é que o Sr. Toda a Gente concluiu ter compreendido a mensagem
de João Eduardo Ferreira e pondo-a em prática a partir da última estrofe! Matou
o vizinho. Qual o problema? Nem o autor se incomoda com o leitor, nem o leitor
se incomoda com o autor. Livro comprado, cada qual faz dele o que melhor lhe
aprouver.
Pedro Toda a Gente,
acrítico literário
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