O melhor
do filme é mesmo Willem Dafoe. Esse gentil monstro, criança aflita, que marca
de modo tão plástico todas as cenas de uma família quase normal. Tommaso,
realizador a preparar o argumento de um filme está em crise, não propriamente de
criatividade mas da tal “normalidade”. Vive em Roma com a esposa e a filha
pequena, dá aulas de expressão dramática e dança, vai a sessões dos alcoólicos
anónimos, à noite enerva-se com os sem-abrigo barulhentos, vai às compras, passeia
nos jardins, vai arranjar o candeeiro. A família rouba-lhe espaço e afecto, tem
pesadelos e uma ou outra alucinação. Normal. A posição de Tommaso no centro de
cada cena, câmara junto ao rosto e a expressão marcada pelas rugas, é
sintomática de uma cidade quente mas intimamente solitária.
Muito
curioso, esse lado de Abel Ferrara ao colocar a sua própria esposa e filha (Cristina
Chiriac, Anna Ferrara) nos braços de Tommaso, persona dele próprio. Tal como
recentemente fizera Pedro Almodóvar em «Dor e Glória» com a persona do
realizador Salvador Mallo interpretado pelo também ‘plástico’ Antonio Banderas.
Só que aqui a moral da história parece ser: ‘a vida normal levará à loucura!’.
Pena é
que, aqui e ali, o caminho da narrativa se vai enrolando em momentos ‘quase banais’,
coisa que não se espera de Abel Ferrara ou de Willem Dafoe.
jef, dezembro
2019
«Tommaso»
de Abel Ferrara. Com Willem Dafoe, Cristina Chiriac, Anna Ferrara, Stella
Mastrantonio. Argumento: Abel Ferrara. Fotografia: Peter Zeitlinger. Itália,
2019, Cores, 115 min.
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